terça-feira, 29 de dezembro de 2020

NASCE UMA RAINHA: ALEXIA TWISTER, GLÓRIA GROOVE e o BASTA dos NÃO RECOMENDADOS

 


Por Rivanio Almeida Santos (Rivas)

Quando vou fazer um trabalho artístico gosto de ouvir músicas ou assistir filmes ou séries que me ajudem a viajar na criação, a refletir enquanto vou executando meu trabalho. Este dias com uma encomenda de camiseta a entregar decidir assistir NASCE UMA RAINHA, um reality show do Netflix (sim, tenho mergulhado no streaming).

O programa, apresentado pelas magníficas artistas ALEXIA TWISTER e GLÓRIA GROOVE, trás algo que vai além da frescura tão estereotipada ao universo de nós LGBTQIA+, mais a frente, quem ler esse texto, vai ter uma noção porque digo isso. Aliás, o que menos se tem ali é frescura, e as que aparecem são temperos, toques de humor para deixar o clima ainda mais leve. E olha, eu diria, é beeeem temperado, mas tem cheiro de afeto, carinho e sabor forte de resistência. É bem especial.

O programa propõe "ajudar drags a realizarem seus sonhos e arrasarem nos shows", como diz a própria descrição no aplicativo. Mas, vemos que não é apenas isso. Eles vão além dessa proposta... ajudam EMPODERAR ARTISTAS em AUTOCONHECIMENTO, ajudam artistas em PROCESSOS DE CONSTRUÇÕES, além de ajudar pessoas próximas a eles a entrarem nesses universos para verem suas condições e opções por outras perspectivas, em sua maioria, pelo lado da importância desse universo - complexo para muitos - para a felicidade do artista participante e assim fortalecer suas relações de afeto.

Na temporada, no ar desde novembro, ajudam cinco drag queens e um drag king (adorei esse, inclusive). Nesses seis episódios é incrível ver o quão o aspecto artístico e do apoio das pessoas queridas são fundamentais no fortalecimento psicológico dos participantes e os ajudam a vencer muitas barreiras.

A cada episódio uma abordagem diferente, com convidados diferentes, para desmistificar e quebrarem paradigmas. Sempre levando em consideração as barreiras que as pessoas apontadas como importantes na vida dos personagens indicam como suas principais "preocupações" para a não aceitação da escolha artística, mas que sabemos não passar da desinformação e preconceito em conflitos com o amor que dizem sentir - tenho sempre um pé atrás com esses "amores" e no fundo acho que é vergonha da pessoa mostrar ser o que e uma gogantesca  vontade de controlar a vida do outro.

Cada episódio daria para escrever várias páginas, pois tocam em nuances super delicadas para quem é do meio. Contudo, quero me ater ao último da temporada que mostra a evolução de Marcos, um jovem pobre de periferia que estudou e se formou arquiteto, um defensor de suas raízes e de sua condição afetiva. Ver-se em sua face, e no seu corpo, a resistência que a vida lhe obrigou a desenvolver, contudo é notório no seu olhar que algo lhe falta para ser completo, ele precisa aliar toda sua vida, criação, suas falas, argumentações, lutas e trabalhos. Ele precisa expressar tudo isso artisticamente através do seu corpo. Incorporar e extravasar. Confesso que de início não estava acreditando nesse participante dada a sua quase inflexibilidade corporal, mas me deixei levar... assim como ele se deixou e ali nasceu uma rainha. Nasceu nele, no palco e entãona tela, ADLA DAVIS. Na sua apresentação final de participação do programa performa a música "NÃO RECOMENDADO" de CAIO PRADO (só conheci agora e do que já ouvi sobre suas músicas e letras eu diria... UAU!). Uma excelente escolha para mensagem final da temporada.  Me emocionei com sua entrega, com a sua performance, a verdade de todo o contexto e a letra da música que diz tanta coisa que nós,  LGBTQIA+, estamos exaustos de ouvir. Um trecho  da canção diz:

"Pervertido, mal amado
Menino malvado, cuidado
Má influência, péssima aparência
Menino indecente, viado

A placa de censura no meu rosto diz:
Não recomendado à sociedade"

Ali soou como UM BASTA. Como um grito que diz "para de me falar estas barbaridades e vem conhecer esse meu mundo que me completa e faz feliz". E eu que já sabia que a arte drag pode ir além da frescura entendi que ela vai muito além desse "além da frescura". Ela pode ser uma ferramenta de luta, de transformação, de empoderamento e de resistência.





FESTA PARA UM CORAÇÃO INDISCIPLINADO 


Por Rivanio Almeida Santos (Rivas)

Quase todo mundo já passou por conflito com o mundo ao seu redor ou com a família por amar alguém que eles não entendiam ou simples não queriam. Sorte daqueles que nunca precisaram enfrentar ninguém por amar outro alguém. Mas, ainda estes seriam capazes de controlar o seu pobre e indisciplinado coração? 


Pois bem, vamos para Broadway e não se preocupam com a conta. Não vamos gastar nada além da assinaturas da Netflix para assistir "The Prom" ou simplesmente " Afesta de Formatura", como nominado no Brasil. Pelo que pude apurar bem rapidamente o filme é inspirado em um musical da Broadway. 


Imagine você que um grupo de teatro formado por artistas que já foram muito famosos e então em decadência recebe uma crítica pesada ao ponto de fazer a peça ser cancelada. Altamente egoistas, egocentristas (e divertidos) decidem então que precisam fazer algo relevante para usar como publicidade e então voltarem por cima. Decidem por fim virarem ativista de causas importantes. Depois de procurarem por uma causa encontram a de uma jovem finalizando o ensino médio, Emma, que quer levar a namorada ao baile de formatura. Mas, para evitar o que poderia ser um escândalo o grupo de pais da escola decide cancelar a realização do evento. 


O famigerado grupo de artista decide ir de carona com outro grupo, de coral gospel, para Indiana, onde tudo ocorre. Lá o enredo transcorre e, além da história de Emma - que foi abandonada pelos pais quando assumiu-se lésbica - podemos conhecer sobre cada um dos personagens e o os levou as se tornarem pessoas fracassadas e individualistas. Histórias de frustrações profissionais, humilhações por ser gay, vítimas de aproveitadores amorosos, abandondo pelo marido e pessoas que apesar de pregarem o amor de Deus, praticam e cultivam não apenas o desamor e desunião. Elas incentivam o ódio, que é vencido com o diálogo e argumentos sobre a hipocrisia que há na defesa das escolhas "escolhidas" para serem taxadas como certas e no ataques àquelas que devem ser consideradas erradas. "Ame o seu próximo, ame o seu próximo, ame o seu próximo acima de tudo" diz uma das canções. 


Apesar de ser o que alguns possam considerar meloso o filme como um bom musical tem uma linguagem divertida, leve, alegre, emocionante e, diria, até didática para mostrar mais uma vez o que a comunidade LGBTQIA+ tem que enfrentar na vida. Muitas vezes tendo que não ficar com a pessoa amada. Outra canção diz algo como "não poder está com você foi a gota d'água e tive que dissimular meu pobre coraçãozinho indisciplinado". Porque na real é isso, ninguém manda o coração amar quem queremos, ou quem querem, que ele ame. Indisciplinado que é ele ama quem ele quer. 


E nesse filme que adoraria ter visto na sessão da tarde na minha época de adolescente podemos contar com as interpretações maravilhosas de Meryl Streep , James Corden, Nicole Kidman, Kerry Washington, Keegan-Michael Key, Andrew Rannells e Ariana DeBose. 


Outro spoiler que posso adiantar, se é que já não falei tudo, é que o amor... é bom vê-lo vencer, acolhendo e transformando pessoas. E em tempos tão amargos um pouco desse mel aquece o coração de quem ama e sonha com dias melhores.

COISA MAIS LINDA É A COISA MAIS LINDA 

 

Por Rivanio Almeida Santos (Rivas)

Nesse recesso de fim de ano estava eu procurando algo no Netflix para passar o tempo e relaxar quando encontrei a série brasileira "Coisa mais linda" (referência a música Garota de Ipanema)

, que, nos leva aos tempos do surgimento da Bossa Nova, no final dos anos 1950 e início dos 60. Inclusive, com personagens q nos fazem lembrar os grandes artistas nacionais da época como Chico e Marieta, Roberto Menescal, Elza Soares e Garrincha, Eliete Cardoso dentre outros. São treze episódios distribuídos em duas temporadas até agora - uma terceira ainda não foi confirmada pelo aplicativo - em que o enredo gira em torno da vida de 04 mulheres incríveis interpretadas por Maria Casadevall (Malu), Pathy Dejesus (Adélia), Fernanda Vasconcellos (Lígia) e Mel Lisboa (Teresa). 


De início a trama mostra as duas primeiras protagonistas que se conhecem em situações super chatas e se mostram completamente diferentes. Malu é branca, paulista, rica, filha de fazendeiro e que quer trabalhar após ter sido abandonada pelo marido, que lhe roubou tudo. Enquanto Adélia é preta, carioca, moradora de um morro, trabalha desde os 08 anos, mãe solteira - se envolveu com o filho dos patrões - e precisa sustentar a filha e da irmã mais nova. 


A terceira protagonista, interpretada por Mel Lisboa - a eterna Anita - é a jornalista feminista Theresa. Ela trabalha em uma revista direcionada ao público feminino e que é escrita quase em sua totalidade por homens - ela é a única mulher da equipe até um determinado momento da trama - e precisa enfrentar o preconceito "das companheiras" de trabalho (sim... eles assinavam as matérias com pseudônimos femininos). Apesar de ser uma mulher à frente de seu tempo, independente, mente aberta - e que, não apenas sonha, tenta fazer as pessoas compreenderem um mundo mais livre - ela sonha formar família com o marido, com quem perdeu um filho ainda pequeno. 


Ligia, a quarta protagonista, é interpretada por Fernanda Vasconcelos. É cantora, sonhadora, casada com um político de uma falida família tradicional da cidade que sonha ser prefeito da Guanabara - atual cidade do Rio de Janeiro - e não só não a apoiava na carreira de cantora da esposa como a impedia e destruía sua autoestima. Como toda vítima de marido machista ela era apaixonada por ele, que impunha suas vontades em jogos de pressões afetivas e psicológicas. Ela, sem perceber que precisava reagir por ser vítima dessa violência, era submetida às suas recorrentes e convenientes sugestões como roupa a vestir, corte de cabelo, parar de cantar e ainda era violentada física e sexualmente. Como não suficiente Lígia se culpava por ser sonhadora e assim dava razões a tudo que passava. 


No desenrolar da série podemos ver histórias de amores, amizades, traições, golpes, misoginia, machismo e feminicídio. Um alerta para o fato de que não conhecemos ninguém a fundo a não ser aquilo que querem que conheçamos. Todo mundo tem sua vida, sua individualidade, conflitos, segredos, histórias, traumas e monstros. 


Na história é inspirador ver estas quatro mulheres que juntas tentam fazer um novo futuro, ainda que enfrentem tantos percalços comuns naqueles anos (e ainda hoje). Quer exemplos? O Pai da Malu querer casá-la novamente para evitar um escândalo na sociedade Paulista. Adélia tinha uma patroa das antigas que a tratava com humilhações através de "privilégios" de dar 1 dia de folga, "permitir" que leve suas roupas para serem lavadas em casa, desconta dia não trabalhado e faz subir de escada nove andares com sacolas de compras para não subir do elevador social. Além de, por ser preta, sempre ser confundida com empregada mesmo quando já estava em melhores condições. 


Se ainda hoje as mulheres, apesar dos avanços, ainda sofrem com preconceitos e desigualdades, imaginem naquele tempo quando, por exemplo, por lei mulher não trabalhava sem a permissão do marido sob alegação de que isso era para lhes proteger. 


Percebe-se no decorrer dos episódios, quem tem o mínimo de sensibilidade e empatia, que apesar de alguns avanços ainda não está tudo bem (e anda longe de ficar) e por isso todas as conquistas das mulheres devem servir como motivação para continuarmos nas lutas por respeito e igualdade de diretos. E quando falo em continuarmos a luta quero dizer que não é preciso ser mulher pra lutar pelos direitos delas, assim como não é preciso ser preto para combater o racismo e nem ser LGBTQIA+ para defender os direitos dos LGBTQIA+. E mais... é preciso mais que isso, é preciso ser antimisoginia, antirracismo e anti-homofobia. Como diz o rapper Emicida no documentário AmarElo, a luta é uma só. 


As histórias retratadas facilmente nos soam familiares por diversos fatores, mas, principalmente, por se passarem em um passado recente (anos 1950 e 1960), tempos vividos por nossos pais e avós e sobre os quais já ouvimos em conversas caseiras. Estas mesmas histórias nos emocionam por vermos que ser mulher nunca foi fácil, mas que muitas enfrentaram e pagaram os altos preços cobrados para serem independentes, donas de si e iniciarem as lutas que tantas outras hoje seguem no fronte. 


A série, com classificação para 16 anos (mais por cenas mais picants que as ousadas intimidades das novelas dos anos 80 - que por uso de álcool e drogas), nos encanta pela linguagem brasileira, fotografia cinematográfica, cenários e caracterizações detalhadas, preparadas com capricho. Além disso, merece uma referência exclusiva à trilha sonora, como já era de se esperar. Somos brindados por regravações - e interpretação dos personagens - de músicas como "É luxo só" ( de João Gilberto), "É preciso dizer adeus" (de Tom Jobim), "Adeus batucada" (de Synval Silva que já fora sucesso de Carmem Miranda). Além disso, somos premiados com músicas como "Para ver você" e "Ver o mar" ambas do, até então desconhecido por mim, João Erbetta. Aliás, é dele ainda "Noite sem luar" que dramaturgicamente é uma composição de Lígia, a sonhadora cantora que tinha decidido refazer sua vida e sua carreira fora do país e - alerta spoille - é assassinada em pleno réveillon pelo violento ex-marido político com quem não quer ter mais nenhuma ligação. A letra traduz o sonho de muitas Lígias da vida real: "Eu vou sair pra ver o sol / No meu caminho eu sou o meu farol / Das nuvens eu vejo o cais / Sinto o vento a me guiar / Eu sei que vou sair da escuridão".

Era uma vez... CUIDADO, TÓXICO! 

 



A série The Crown da Netflix é um sucesso desde a primeira temporada, por mostrar nas telas parte da história mundial. Até agora foram quatro temporadas. Eu mesmo assisti à todas as temporadas. Sempre esperando a temporada seguinte. E mais aguardada, quarta, pode ser um choque para quem pensou que conhecia a história de Charles e Diana. Embora não se aprofunde na história do casal em si, uma vez que a série busca mostrar tudo que envolve a "coroa". É possível perceber que o casamento de Charles e Diana foi uma sucessão de erros. 


Quem quiser aprofundar mais na vida de Charles e Di convido a também assistir o documentário "Lady Di: suas últimas palavras", produção da Nacional Geographic disponível também no Netflix. São trechos de várias entrevistas e de uma entrevista secreta que a Princesa de Gales deu a Andrew Morton, jornalista que escreveu o livro "Diana, sua verdadeira história". É forte, trágico, triste e até revoltante. Porém, nos faz entender muitas coisas sobre o universo real inglês e sobre temas como patriarcado, machismo e relações tóxicas, que é o tema que destaco aqui. 


Charles que era amante de Camilla Parker Bowles (ela era casada) já passava dos 30 anos e sofria pressão para um casamento, que deveria ser com uma virgem de linhagem aristocrática. Diana Spencer, uma jovem de 19, professora primária que preenchia todos os requisitos e fora aprovada pela família. Ela só não imaginava que estava entrando numa boca quente (como dizem por aqui). Desde que aceitou o pedido de casamento meio que fora atirada na jaula dos leões sozinha. Colocada num apartamento real, o noivo viajou e só voltaria na semana do casamento. Nem com a sogra tinha consentimento para falar. Num "lar" tão cheio de gente, começara ali sua vida de solidão, tristeza e frustrações. E, conforme declarou em entrevistas, mostradas no documentário, no dia do casamento sentiu-se indo para o abate, o que de certa forma era um fato. 


É de chatear ver que Diana passou por situações de humilhações inaceitáveis, como sair almoço (ou era jantar?... não importa) com a amante do noivo, recebeu então muitas dicas da tal de como agradar ao príncipe, não conseguia falar com o noivo viajante enquanto ele falava todos os dias com sua "camarada" (como falavam antigamente no Maranhão), ouviu dele - um dia antes do casório - que não a amava, viu a amante entre os convidados enquanto era conduzida pelo pai ao altar e viu o já marido levar na viagem de lua de mel presentes e fotos da outra. Ah, desistência do casamento e divórcio não era uma opção. 


Assistindo à série e o documentário vê-se que Lady Di não tinha suas vontades acolhidas, nem ao menos eram ouvidas. Sofreu de bulimia, teve depressão e tentou suicídio algumas vezes - chegou a se jogar de uma escada quando estava grávida do Príncipe William -. O distúrbio alimentar, ela disse, foi gerado pelo fato da pressão sentida quando na semana do noivado o então noivo pegou em sua cintura e disse que ela tava cheinha. Mas, todo esse combo indesejável porque não era amada por quem ainda amava. Entristece ver que se anulava principalmente porque se sentia fraca, impotente diante de toda a situação. Algumas vezes, já na fase mais crítica das relações, a família real reagia dizendo que ela era louca, que era mimada, se vitimava, que provocava confusões... a culpa era dela. Ignoravam a ela, seus sentimentos e sua doença. 


Outro fato que chama atenção era que seu carisma e sua beleza faziam-lhe roubar a cena onde chegasse. Para onde ela fosse, mesmo que tivesse alguém da família do marido, as pessoas iam para vê-la e não vê-los. Isso causou despeito, ciúmes, inveja e ainda mais incômodo e distanciamento. Di sofria por ser vítima dessa relação tóxica que tinha não apenas em relação ao marido, mas com a coroa.  


Como toda vítima de relacionamentos tóxicos Diana sempre fez o que os outros esperavam da Princesa. Mas, nunca pode ser a Diana e isso era visível a olhos nus. Quanto decidiu ser ela mesma já era tarde. Tinha sido condenada a ter vida devastada, vigiada, exposta para o mundo através das lentes de paparazzis que faziam tudo agora imagens que lhes rendem muitas cifras. Foi assim até quando morreu, embora sua existência já fosse sem vida havia muito tempo. 


Essa história deve servir de reflexão a todos. Como estamos nos posicionando em nossas relações? Qual papel estamos assumindo, Diana ou Charles? O que estamos fazendo de nossas vidas? A troco de quê? Vale a pena? Não nos permitamos ser nem um e nem outro. Mudemos.


Casar com o príncipe encantado e ter uma vida envenenada por tanta toxidade não é o sonho de contos de fadas nem das pessoas mais gananciosas. Posso não estar conseguindo ver algum ângulo diferente. Pode até ser... Quer tirar as suas próprias conclusões? Assista aos dois trabalhos e me passa a sua visão. Enquanto isso eu sigo pensando que nada justifica a toxidade em uma relação.

veja AmarElo



Por Rivanio Almeida Santos (Rivas)

Ontem recebi uma mensagem de minha irmã Rogenir Almeida Santos Costa sinalizando que queria falar comigo. Quando conseguimos efetuar a vídeo chamada pomos os papos em dia, rimos um bocado e tal. Até me falar do real motivo da chamada. Conhecedora do meu gosto, meu sentimento de justiça, de identificação com as causas raciais, em especial contra o racismo. Ela queria me indicar o documentário AmarElo, do repper brasileiro Emicida. 


Rap nunca foi minha música preferida, não pelo conteúdo, que normalmente são sobre lutas do povo preto, mas pela rapidez que emitem as palavras. Eu sou um tanto quanto lento para acompanhar. Contudo, sempre gostei do Emicida por sua história, sua postura, discurso e suas ações. 


Acordei na madrugada e para me distrair decidi ver o filme, que tá no Netflix. Gente... o que é isso? Ela me avisou da emoção que era o filme, mas não pensei que fosse tão forte para quem é preto ou se identifica com as questões de lutas contra os preconceitos. 


Emicida trás músicas de letras incríveis com mensagens mais que necessárias. Além disso, ele volta no tempo em uma narrativa que conta a nossa história de lutas nos trazendo a contextualização de temas muito relevantes (escravidão, trabalho, imigração, periferia, hip-hop entre outros) e trás importantes participações especiais de grandes representações do cenário cultural brasileiro, como Zeca Pagodinho (cantor), Fernanda Montenegro (atriz), Marcos Valle (compositor, cantor, instrumentista e arranjador), personagens importantes no surgimento do Movimento Negro Unificado (MNU), Abdias do Nascimento (criador do Teatro Experimental do Negro - TEN) e ainda nos brinda com citações sobre Lélia González (filósofa), Ruth de Souza (atriz), Os 8 Batutas (grupo de samba), Leci Brandão (Compositora e Cantora) e vários outros. 


Para fechar o show no Teatro Municipal de São Paulo que vem recortando todo o desenrolar do documentário e é um marco na história do movimento, por ser a primeira vez que uma ocupação/apresentação do gênero (e de vários pessoas que trabalharam no show) em um espaço sempre tão elitista, Emicida recebe as cantoras Pabllo Vittar e Majur para uma versão arrepiante de "Sujeito de Sorte", de Belchior, que dentre um conteúdo forte diz algo que fala muito sobre as lutas das minorias "tenho sangrado demais, tenho chorado pra cachorro. Ano passado eu morri, mas esse ano não morro". Dando essa ideia reflexiva de que chega de apanharmos, que nossas lutas e resistências têm engrossado nosso couro e nosso coro, que seguiremos resistindo. Emicida deixa, com essas participações, essa mensagem de união das lutas, pois no fim das contas a luta é a mesma, contra o preconceito. Como ele mesmo diz: "E tudo, tudo, tudo, tudo que nós tem é nós".