segunda-feira, 15 de novembro de 2021

O DEBOCHE NEGACIONISTA


Por Rivanio Almeida Santos.



Vi esta imagem sendo postada por vários conhecidos meus no facebook. Como sou ligado a cultura, turismo e ao carnaval venho com toda licença e respeito aí amigo quero dizer que desconcordo com a proposta do card postado.

 O carnaval vai além da Folia a que todos querem taxar como o resumo de tudo. A atividade carnavalesca vai muito além isso. Temos muitas pessoas que tem nesse período um meio de seu sustento e de sua família. Além dos cantores têm os trabalhos formais gerados, com contratação de músicos, iluminadores, escultores, pintores, marceneiro, eletricista, produtores, montadores, malharias, empresas gráficas, seguranças, por exemplo. Além disso, tem uma cadeia ainda maior de empresas (hotéis, restaurantes, farmácias, lanchonetes, bares) e trabalhos informais q se beneficiam com o período como vendedores de água, cerveja, refrigerante, churrasquinho, caçadores de reciclados... e muito mais. 

Depois nos eventos de carnaval apontado na imagem como fundamento para essa campanha sem nexo, é preciso lembrar que no ápice da pandemia, quando tinhamos a necessidade de ficar em não se casa, não tinha vacina ainda e a doença desconhecida avançava. É absolutamente incomparável e injusto comparar com hoje que temos mais da metade da população vacinada, as mortes caindo e os novos casos diminuindo. Tudo isso apesar da campanha contra de muitos. Aliás, essa imagem tem bem o perfil e a cara dos que foram contra o isolamento social e a vacina.

Há no carnaval uma grande cadeia produtiva que ainda assim ficaram todos esse período todo arcando as consequências e sem trabalho. Quando TODOS param essa galera já estava parada, exceto os casos de serviços essenciais. Contudo, muitos setores já voltaram há muito tempo. Agora que as atividades voltadas ao turismo, lazer e geração de renda através do entretenimento estão voltando alguém começa essa campanha irônica, debochada, usando a memória das vítimas do negacionismo e da irresponsabilidade pública brasileira. Uma piada totalmente vil e sem graça. Uma desgraçada total.

domingo, 14 de novembro de 2021

GRATIDÃO E ADEUS AO FALAFINA


Por Rivanio Almeida Santos 

 Também no domingo pela manhã eu pequeno acordava cedo, chamado pelo pai para ir à chácara pegar leite enquanto ele ia ao mercado comprar carne e a mãe passava o café e preparava os acompanhamentos do café da manhã e já iniciar os preparativos do almoço. Ao sair pela porta do terraço já via, ouvia e cumprimentava Seu Santinho, Seu Antônio Carpinteiro (o Caripina) conversando enquanto Seu Sebastião Falafina, em pé na calçada com as barras das calças dobradas até o joelho, escovava os dentes com um copo de alumínio com água nas mãos. Findado a higiene bucal se acocarava e ficavam por ali comentando os noticiários da TV da noite anterior e puxando brincadeira com quem passava pela rua.



Foi a voz fina e estridente, que rendeu ao Seu Sebastião apelido de Falafina, era marcante, inconfundível e rendiam as melhores gargalhadas que pude ouvir a vida toda. A mesma gargalhada que soltou quando foi lá em casa pedir o "picinez" do meu pai e eu sem perguntar o que era peguei a navalha de por Gillette de raspar barba. Quando percebeu gargalhou da minha ingenuidade e explicou do que se tratava. O picinez, na verdade  pincenê, nada mais é que o nome antigo dado aos óculos. Essa história pra mim é inesquecível.

Seu Sebastião sempre foi nosso vizinho, dos mais chegados. Um dos melhores amigos do meu pai, da minha família. Aliás, um dos melhores amigos de toda aquela gente. Apesar de dono um dos gênios mais fortes que já conheci, era uma pessoa de coração gigante. São muitas histórias que poderia mencionar que estão ligadas a minha memória afetiva. É impossível falar de minha infância sem mencionar o Falafina ou alguém da família Guimarães.

Renderia alguns capítulos a sua participação na Construção do Colégio Santa Teresa quando, salvo melhor memória, ele era o Presidente da Associação de Moradores. Ele sempre foi presente nas causas e na vida pública e política da comunidade.




Eu poderia escrever sobre o fato de sua casa ficar o dia inteiro aberta, tanto as portas da frente quando dos fundos. Um sinal da paz que era nossa Santa Teresa do Paruá e da confiança que ele tinha na gente daquele lugar. Aliás, sua casa mereceria um filme de suspense, pois eu morria de medo de passar a noite na calçada. Lá fora local do velório de seu filho, alem de alguns parentes ou amigos. Situações que viraram folclore entre as crianças da rua.

Poderia falar do homem que tinha, apesar do  estudo não muito aprofundado, perfil de gestor e espírito de liderança. Criava gado, quando era possível vendeu madeira - recordo dos troncos gigantes de árvores que nós brincávamos correndo sobre, ali do lado de casa -, vendeu estacas, acredito que negociou ouro pois alguns dos seus filhos trabalharam em garimpo (mas não tenho certeza) e foi dono de usina. Fora justamente nesse prédio da usina que foi instalado o primeiro hospital de Santa Teresa, o Hospital Cristo Rei (do Dr. Humberto. Marido da Dra. Olívia).

Era muito bom quando seus netos - Hildegardia, Erick e Édipo - que hoje moram em São Luís, mas dantes residiam em Taguatinga, cidade satélite Brasília, iam passar férias. Éramos como primos, vivíamos uns na casa dos outros brincando de tudo que era possível.

Recordo de um de seus aniversários - não sei de 50 ou 60 anos - deixou a cidade empolvorosa com o churrasco feito, para o qual vieram seus parentes que moram longe. Foi a primeira vez que vi um evento gravado em fita de vídeo, em que pude ver as pessoas ali de perto na TV. E foi pela telinha que vi a festa... eu era pequeno e meus pais não permitiram minha ida. Contudo, a atmosfera era festiva e já me deixava feliz.

Lembro bem que mandou matar um barrão que criava e Dona Raimunda, que trabalhou na sua casa por anos, fritou o toucinho transformando em torresmo. Eu na gula adolescente fazia um cone de papel de embrulho e ia encher de torresmo nas bacias que ficaram sobre a mesa da sala de jantar da casa.

Seu Bartião era pai do Claudionor (Boiô), da Ana Joaquina, Elza, Cláudio, Guimarães e do Claudimar e mais tarde da Lorrane, do seu casamento com a sua querida companheira Rosa. Sempre os melhores amigos das pessoas lá de casa. Pessoas que temos todo carinho, consideração e respeito. Recordo de que era um pai carinhoso com as meninas, com os rapazes um carinho mais contido, mas loucos por todos. Contudo, com os netos era sem barreiras. Um amor sem medidas. Era apaixonado pelas crianças.

Seu espírito público o levou a ser o segundo prefeito de Santa Teresa do Paruá, quando emancipada e recebeu a alcunha de Presidente Médici. Ele que já era parte da história oral da cidade, entrou pra história oficial.

As duas últimas vezes que o encontrei (aniversário de 60 anos de seu genro Nonato e quando veio fazer uma cirurgia) em São Luís, ela já bem idoso. Foram reencontros que me emocionaram. Foram como se eu estivesse reencontrando um pouco meu pai.

Quando meu faleceu ele foi um dos que mais sentiram.  Recordo da tristeza que ele e os demais amigos ficaram quando Juruca foi para o andar de cima... eles eram confidentes, conselheiros, ombro amigo, irmãos.

Hoje, 14 de novembro de 2021, aqui em São Luís o dia amanheceu nublado, ventinho frio, tristonho e mais silencioso que o normal para um domingo. Abri o celular e me deparei com uma nota de pesar anunciando o falecimento de Sebastião Guimarães Filho, o nosso querido Sebastião Falafina.  O sentimento é que mais um pouco do meu pai que se encontrava por aqui se foi.

Queria aqui registrar esses momentos vividos. Queria registrar o tamanho da importância desse ser humano na formação da nossa população em agentes um pouco mais políticos. E jamais poderia deixar de falar da sua presença nas memórias afetivas mais fortes e carinhosas da minha vida e da minha família.

Nossos sentimentos a todos da Família Guimarães, a família formada por todos seus amigos que conquistou.

Cala-se a fala fina, perde-se o Falafina, mas ficamos uma robusta memória da história de um homem que fez história.

Missão cumprida, hora de se retirar e descansar. Fica nossa gratidão.