domingo, 24 de outubro de 2021

SAMBA E CHORO GÊNEROS DEMOCRÁTICOS

 Estou em casa nesse momento vendo Enoque bordar sua fantasia para o Carnaval 2022 - para quem não sabe ele é Destaque da Grande Rio no Rio de Janeiro-. Meu corpo está exausto de tanto trabalho da semana. Mas, completamente agradecido a Deus por isso. Eu estava com saudade desse movimento. Coração feliz pelo fato de em 2 anos essa ser uma semana quase normal, como antes. Teve viagem a trabalho pela Vivo com eventos e prospecção de parceiros. E teve RicoChoro ComVida na área aberta do Museu Histórico e Artístico do Maranhão.


Público do Sarau RicoChoro ComVida no Museu Histórico e Artístico do Maranhão 


A noite de ontem foi mágica, chorinho, sambinha, poesias, pessoas queridas circulando, sorrindo com os olhos pra causa das máscaras. Foi um encontro maravilhoso de pessoas que gostam de boa música, todos apaixonados pelo samba e pelo chorinho. Baixos, altos, magros, gordos, pretos, amarelo, brancos, rosados, cabelos crespos, cabelos lisos, doutores, estudantes, pessoas de baixa escolaridade, gente rica, gente pobre, moradores da Península, moradores da área Itaqui Bacanga... enfim, todos curtindo a noite, a música, os encontros e as conversas com os olhos brilhando.

Como o chorinho e o samba são democrático e acolhedores, né? Isso é fabuloso. Durante o eventos de ontem eu tava refletindo sobre isso e hoje, domingo, 24 de outubro de 2021, vendo meu companheiro Enoque, bordando peças que vão compor sua fantasia de destaque principal de uma alegoria da Grande Rio, lá no Rio de Janeiro, me dar um orgulho enorme perceber isso esse espaço, pois não é um planejamento arquitetônico. Isso é! Só é! E só é  porque as partes têm sentimentos genuidos de respeito e reciprocidade. O samba, em especial de enredos, homenageam cantores como Zezé de Camargo, Chico Buarque, Elza Soares, Elis Regina, Roberto Carlos, Tom João,  Maria Bethânia, Ivete Sangalo, além de outros grandes brasileiros como Apresentador Silvio Santos, o jogador Pelé, o jornalista Assis Chateaubriand e Maestro João Carlos Diniz por exemplo. No mundo do samba é assim é amor em cima de alegria, é acolhimento em cima de hospitalidade. A própria história do samba e das Escolas de Samba mostram isso e como é lindo de ver.

O chorinho, que oficialmente é tido como carioca, sabe-se que no mesmo período do seu surgimento diversas outras cidades cidades país, inclusive aqui no meu Maranhão, tocavam músicas do gênero com características próprias. Hoje é um dos principais generos musicais brasileiros, junto do samba. Aliás, o próprio samba surgiu dos batuques vindo da África e incorporou outros elementos no Rio de Janeiro com influência também de pretos idos da Bahia.

Com o passar dos anos temos esses gêneros crescendo, evoluindo, surgem as escolas de samba e tal. Contudo, nunca, jamais perdeu sua característica de agregar e acolher quem mostra por ele afeto, confiança, verdade e reciprocidade. Querem exemplos? Seguem uns bem próximos a mim.

Ricarte Almeida Santos


O choro, talvez o mais desconfiado dos gêneros, talvez por duas músicas na maioria das vezes falar de amores, desilusões amorosas, dores de amor, eles vão acolhendo com o pé atrás, até caírem de amores. Meu irmão Ricarte, que apesar de não tocar nenhum instrumento musical e nem cantar, é dos maiores incentivadores do gênero no país. Apresenta o programa Chorinhos & Chorões há aproximadamente 30 anos e criou vários projetos para apresentações do gênero ao longo dos anos, como o de ontem à noite. Os grandes Chorões locais e nacionais dão o valor e a importância que o trabalho de Ricarte merece por tudo que têm feito até aqui, pois é inegável sua significativa contribuição para o crescimento do Chorinho em solos maranhenses. E ontem, além de encontro de  gerações havia no espaço pequenos empreendedores como forma de ajudar-lhes  em oportunidades de negócios.


Biné Gomes, eu e Enoque Silva com Joãosinho Trinta 

Do samba, que é mais festivo e mais  esfuziante tenho mais exemplos. Estes ligados às escolas de samba. Primeiro falo de João Trinta, de quem fui colaborador compondo sua última equipe de trabalho. Ele era maranhense e, ainda jovem, foi ao Rio de Janeiro realizar o sonho de ser bailarino.  Acabou carnavalesco da Acadêmicos do Salgueiro, Beija-flor, Vila Isabel e Grande Rio. Revolucionou o fazer escola de samba e é considerado o Gênio do Carnaval Brasileiro, pois seus feitos inspiram agremiações por todo país. Joãosinho representou o Brasil, através do carnaval, pelo mundo todo. Foram festas para sheiks, reis e príncipes.  Foi reverenciado por quase todos os brasileiros, a começar pelas agremiações por onde passou.

Enoque Silva em desfile da Grande Rio, 2021.

Outro exemplo é de dentro de casa e tem toda minha admiração. Enoque, meu companheiro de vida é um artista visual e carnavalesco maranhense de características físicas indígenas, morador de São Luís, e que tem 42 anos de trabalhos ligados ao carnaval dos quais há 25 compõe o quadro fixo de Destaques de Luxo da Acadêmicos do Grande Rio, que o acolhe com todo respeito. Isso dado seu investimento Artístico, logístico, sua entrega dedicada e caprichada à cada desfile.

Eu, Milton Cunha e Enoque Silva na Cidade do Samba.

Posso citar ainda o meu amigo, irmão de alma, um querido por quem tenho muito respeito e admiração por sua história e por tudo que me ensina e inspira. Milton é um homem branco, olhos verdes, paraense, nasceu em Soure (Ilha do Marajó) e foi criado em Belém. Foi para o Rio de Janeiro em busca de alçar grande voos. Seus caminhos o levaram a se tornar carnavalesco da Beija-flor, União da Ilha, Leandro, Unidos da Tijuca, São Clemente, Porto da Pedra, Viradouro e Cubango. Sua dedicação pelo trabalho, seu comprometimento e respeito por todas as escolas lhe renderam prestígio. Tornou-se o principal comentarista de carnaval da transmissão da Globo. Ele usa sua voz para dar visibilidade aos que fazem a escola que não são vistos no dia a dia. Ele usa sua voz e sua imagem para dentre tantos assuntos para fortalecer não somente os movimentos escola de samba, mas, o cenário cultural brasileiro como um todo. Ele é das artes como um todo.

Apesar das competições que na Marquês de Sapucaí são levadas muito a sério. Vejo que há, acima de tudo isso, um respeito a quem tem amor ao universo escola de samba. Isso já é o suficiente para ter o respeito de todos. Entretanto, quando a percepção é sobre uma Escola em específico o retorno pode ser ainda mais carregado de acolhimento, consideração e reciprocidade daquela escola. São muitos os exemplos de Intérpretes (antigos puxadores de samba - perdão pelo uso do termo Seu Jamelão), Passistas, Mestres-Sala, Portas-Bandeira, Diretores de Harmonia,  Mestre de Baterias que já transitaram entre várias Escolas e receberam acolhimento e reconhecimento.


Quitéria Chagas 

Nessa perspectiva posso citar Quitéria Chagas que tem uma história linda com o samba. Nasceu na Tijuca, mas sua história a levou ao Império Serrano, ao Cordão do Bola Preta, à Vila Isabel. Retornou à comunidade do morro da Serrinha. De passista foi Rainha da Bateria. Sua ligação, sua dedicação, sua atenção e seu amor ao samba e à própria Império a renderam o título de Eterna Rainha da Escola. Título dado pela após anunciar sua aposentadoria do cargo de Rainha da Bateria. A mulher foi adotada pela escola e pela comunidade a ponto de receber essa homenagem pela qual talvez nunca esperasse. Hoje é inspiração para meninas e mulheres na valorização da sua cultura e de sua gente quer seja nos desfiles ou em suas redes sociais - ela é um rainha bem descolada como uma boa influencer.

O samba, as escolas de samba, o Chorinho... esse universo é muito acolhedor, apesar de sempre terem sido diminuindo, anulados ou embranquecido por quem tinha a função de escrever, documentar a história nacional. Não ha muito tempo esse universo passou a ser objeto de estudo. Com o chorinho e o samba foi assim, mas nunca deixou de ser um ambiente democrático, hospitaleiro, acolhedor e, acima de tudo, feliz. Ontem o retorno do sarau  RicoChoro ComVida foi tão lindo, tão festivo que me deixou reflexivo, me fez lembrar tantas coisas boas que o samba e o chorinho tem me proporcionado, em especial os amigos como os que encontrei ontem e os que citei acima. E isso me fez feliz pra caramba. Que venham o próximo!