domingo, 31 de março de 2024

AS PÁSCOAS MAIS FELIZES NÃO TINHAM OVOS DE CHOCOLATE

 

Padre Diniz na procissão de Páscoa da Comunidade Católica de Santa Teresa do Paruá.

O período Pascal cada dia mais está sendo imortalizado pelos comerciais ovos de  chocolate, ovos de colher, caixas de bombons (cada vez mais vazias) e barras (cada vez menores)... e dá-lhe Garoto, Lacta, Nestlé, Cacau Show, Ferrero Rocher, Kopenhagen... têm sido Páscoas gostosas, mas vazias de significados. Têm valido mais os valores monetário dos ovos que os valores de Cristo.


Eu não sou tão velho assim... (pelo menos ainda), mas, estou caminhando pra lá e ficando sempre mais reflexivo quanto ao ser humano que venho me tornando. E, por esta razão, quando chega estes períodos eu me questiono o motivo de tanta gente tá vivendo distanciamento do sentido real dos designos Divinos e pouca gente, assim como eu seguir sempre buscando o lado do amor, do bem, da solidariedade, da compaixão, da partilha, dos necessitados, dos excluídos, da união... do sentido de renascimento que a vida de Cristo tenta nos ensinar ainda nos dias de hoje?

Bom, apesar de ter nascido em uma família (Assembleia de Deus) eu estudei em uma escola que foi fundada por um Padre Camboniano, o sempre admirado Pe. Diniz, por quem teremos uma eterna gratidão, que teve a sua frente Professora Eliane, Professor Aécio e que mais tarde fora dirigida pelos Irmãos Lassalistas. Embora muito ligada a igreja católica o Colégio Santa Teresa nunca foi excludente, muito, mas, muuuuuuito pelo contrário mesmo. Desde sua  fundação e construção sempre teve a participação e contribuição de todos da comunidade, independente da religião que seguisse. Isso por si só já é um grande ensino de união.

Nas aulas tínhamos todas as atividades muito ecléticas e com a participação de todos. Ali tudo era baseado nos verdadeiros sentidos cristãos. No período Pascal, por exemplo, tínhamos sempre as leituras diárias das passagens bíblicas que eram importantes para entendimento da vida de Cristos e as razões que o levaram a viver e dar sua vida por nós. E na Semana  tínhamos as dramatizações e a celebração da Santa Ceia, onde cada um ficava responsável por levar alguma coisa para preparar a sala para nossa cerimônia do lava-pés. Bacia, toalha de mesa, toalha para secar pés, pães, peixes fritos ou assados, suco de uva (ou vinho, dependendo da série), cada um escolhia o que poderia levar, se pudesse levar. Era lindo de ver e, principalmente, de viver tudo aquilo. Era como se Jesus estivesse presente... e os professores eram os intermediários desse processo de visualização e sentimento do Divino (Salve Mariazinha, Diquinha, Eunice, Brígida, Izabel, Carlos, Ir. Odyllo, Ir. Dionísio, Ir. Renato e tantos outros... e os cânticos? Nossa! Estes foram a trilha sonora das nossas vidas e deixavam tudo mais emocionante:

"E quando amanhecer
O dia eterno, a plena visão,
Ressurgiremos por crer
Nesta Vida escondida no pão"
(Antes da Morte)

"Deus está aqui
Tão certo como o ar que eu respiro
Tão certo como o amanhã que se levantará
Tão certo como eu te falo e podes me ouvir"
(Deus está aqui)

"O senhor é santo
Ele esta aqui
O senhor é santo
Eu posso sentir
Quando olhei o sol brilhar, vi que o senhor é santo
Vendo as estrelas do céu, vi que o senhor é santo
Na imensidão do mar, vi que o senhor é santo
No orvalho da manhã, vi que o senhor é santo"
(O Senhor é Santo)

"Também sou Teu povo, Senhor
E estou nessa estrada
Cada dia mais perto da terra esperada!
Também sou Teu povo, Senhor
E estou nessa estrada"
(O povo de Deus)

"Me chamaste para caminhar na vida contigo
Decidi para sempre seguir-Te, não voltar atrás
Me puseste uma brasa no peito e uma flecha na alma
É difícil, agora, viver sem lembrar-me de Ti"
(Te amarei Senhor)

"E Seu nome era Jesus de Nazaré
Sua fama se espalhou e todos vinham ver
O fenômeno do Jovem Pregador
Que tinha tanto amor!"
(Um Certo Galileu)

Fachada da minha casa, de onde minha família acompanhava a passagem das procissões de Páscoa.


Por falar em música, uma coisa que eu sempre achei o ápice de tudo era a procissão que a igreja católica fazia da entrada da cidade até a frente do Salão Paroquial no Centro Comunitário e depois, com a construção da igreja de Santa Terezinha do Menino Jesus,  até a frente da mesma. A frente das pessoas vinham uns fiéis representando Cristo carregando a Cruz recebendo chicotada dos guardas romanos e quanto Maria acompanhava a paixão de Seu Filho. Atrás deles vinham o padre e as pessoas caminhando devagar, lendo trechos da Bíblia e cantando os cânticos mais lindos e emocionantes que já vi na vida. Para ajudar no alcance da escuta das leituras e acompanharem os cânticos o padre e as pessoas que puxam os textos e a cantoria usam microfones sem fios que eram replicados em radios-gravadores sintonizados na mesma frequência dos microfones.  Nem preciso fechar os olhos... de olhos abertos consigo visualizar perfeitamente o Ir. Dionísio Bruxel segurando um desses rádios-gravadores na altura de seu ombro (ele era um dos mais altas das cidade). Eu não acompanhava a procissão, mas todas as vezes ficava sentado no muro do terraço lá de casa com toda atenção e respeito para ver aquela movimentação que simbolizava pra mim nosso amor ao Pai Celestial.

Esse período sempre foi sinônimo de muita fartura e união  embora nunca tenhamos tido nenhuma graaaande desavença com nossos conterrâneos (salvo as contendas de crianças). Contudo, parece que a chegada da Semana Santa esse sentimento era ainda mais forte e mais lindo - sempre gostei mais que do Natal - pois era o período que a cidade ficava ainda mais cheias dos nossos irmãos  e amigos que moravam fora da nossa Santa Teresa do Paruá. Ali perto de casa iam de São Luís sempre algum dos meus irmãos, D. Fracisquinha e Santídio (mãe e sobrinho do Soares, que moravam em Belém), D. Maria e seu filho Antônio (de Governador Acher, mae e irmão do Osmar Dentista), a Pretinha/Eletilce de D. Adelina (que na época, me parece, morava em Bacabal), Ana do Seu Sebastião Falafina com sua prole (eles moram ainda em Brasília). Na cidade se juntavam à Netinha Soares, Nete do Osmar, Francisca Sales, Maria do Newton, Delina, Lauriza, algumas filhas de Maria do Santinho e era uma produção enorme de canjica, minguau, pamonhas e bolos de milho verde, de tapioca fina, tapioca em caroço e macaxeira... cada uma faziam os seus e depois trocavam pedaços para provarem uma das outras. Era um festival gastronômico e de partilha incrivelmente delicioso de vivenciar. Era muito pouco ver e é pouco ouvir ou ler sobre... bom mesmo foi viver tudo isso de dentro do que se passava. E nós, então crianças, vivíamos em cambada atentando (leia-se brincando e  brigando) juntos, mas nunca nos largávamos.

Maria e Eletilce na produção se bolos da Semana Santa.


Naquela época a semana toda era Santa, digo... feriado...rsrsrs... então dava tempo de vivermos tudo isso e ainda tínhamos tempo de irmos ao terreno da família do Soares na estrada do Centro do Guilherme banhar de açude, ir a nossa chácara na Cabeça da Égua (bairro) assar castanhas e ainda visitar Dona Deuzuíta e Seu Joaquim no Engenho, depois do bairro do Mutirão, onde ela moravam com seus filhos e produziam cana-de-açucar e cachaça da terra (lá tinha um açude maravilhoso... água pra lá de gelada).

Engana-se quem pensa que estou falando de comidas pascais... estou falando das relações cristãs, das relações fraternas, das relações humanas,  pois, sendo cristãos os ensinamentos de Jesus Cristos nunca passou por qualquer sentimento ou prática de exclusão por qualquer que fosse os motivos, nem mesmo por crenças distintas - Isso aprendi graças aos ensinamentos da Palavra Divina passadas por meus professores e pela práticado meu pai Raimundo Juruca. Assim eu sigo tentando viver... e trago essa prática desse período, de onde vêm minhas maiores lembranças, aliás, mais que isso!!! Minhas maiores referências de acolhimento e doação para ajudar o próximo. E eu tenho muito orgulho dessa minha origem.