domingo, 19 de janeiro de 2025

UMA CRÔNICA DE OUTROS CARNAVAIS

 

Desfile da Acadêmicos do Grande Rio, Campeã 2022.

Minha irmã Rogenir, residente há alguns anos em Brasília, sempre me indica editais de concursos culturais e me inscrevo em todos que me encaixo nas regras dos editais. Por conta disso finalizei 2024 fazendo uma crônica sobre o início de minha vida no macrocosmos carnavalesco para me inscrever no último concurso que ele me indicou. Mas, o site de inscrições estava com problemas e não consegui anexar meu arquivo. Perdido o prazo, mas fiquei com vontade de contar as experiências vividas e os acontecimentos interessantes e importantes que prenseciei nestes meus 25 anos de Carnaval no Rio de Janeiro e é o que se segue.


Para começar preciso dizer que sempre gostei muito dos desfiles das Escolas de Samba do Rio de Janeiro e tudo aquilo sempre foi uma realidade muito distante da que eu vivia no interior do Maranhão, onde morei até janeiro de 1995, quando mudei para São Luís. O tempo foi passando, segui estudando para o vestibular e dezembro de 1997, quando aos 18 anos conheci Enoque. Ele começou a desfilar na Sapucaí na Escola de Samba Unidos da Ponte no enredo que homenageou a Marrom em 1994. 

Abre-alas da Unidos da Ponte, 1994. Enoque Silva, Destaque Central baixo.


Apesar de eu gostar muito de carnaval nao era meu universo. Eu não conseguia concatenar tudo que envolve esse novo contexto na minha vida. Como dizem hoje em dia, esse munfo é profundo e tem muitas camadas. Precisei do primeiro ano de relacionamento para processar e entender o que é ter um relacionamento de fato e compreender o tamanho do universo cultural que eu estava entrando, principalmente o carnaval carioca. Entrando nesse momento de compreensão em 1999 fui ao Rio de Janeiro pela primeira vez e logo para o desfilar no sambódromo! Eu na Marquês de Sapucaí!!! Vivi muitas experiências superlativas para o universo tão pequeno que era o meu cotidiano até então.


Já na chegada ao barracão vi pessoas que, para o povo que mora no Rio, pode ser comum encontrar pelas ruas, mas eram pessoas que eu só via na TV. Na primeira ida ao barracão já dei de cara com Fernando Vanicci, então apresentador do Esporte Espetacular e quem fazia a narração dos desfiles na transmissão da TV Globo, e David Brasil. Graças ao meu acanhamento mantive a linha e fingi costume legal. 


No dia do desfile subi na alegoria pela primeira vez e já foi uma emoção grande e forte. Ajudei Enoque a se montar e assisti a chegada das composições do carro que contava ali com as presenças entre eles dos atores Raul Gazola, Beto Simas e da atriz Mônica Carvalho, que usou em sua fantasia um costeiro de penas de pavão coloridas que cobriu parte da fantasia de Enoque - juro que se tivesse uma tesoura lá em cima ele teria cortado as penas, vontade e coragem nunca lhe faltaram.


Após deixá-lo pronto no alto do carro alegórico com a fantasia montada no queijo (nome que se dar à plataforma que as pessoas vêm na alegoria) eu desci do carro e enfrentei aquele meio mundo de gente desconhecida. Estava atônito... Lunático! Desacreditando no que estava vendo, vivendo e sentindo... Literalmente ficava me beliscando no braço e na coxa para me certificar que era tudo real. Decidi ir até a alegoria onde estava Biné - acho que a 7ª alegoria, pois naquela época as agremiações desfilavam com cerca de 8, 9, 10 alegorias. Parte delas ficava pra fora dos portões que isolava a concentração dos curiosos - . Entre o carro abre-alas, onde Enoque estava, e o carro de Biné eu fui vendo cenas marcantes para mim. A sensação era de tá dentro de um filme. Não trabalhando na produção, mas dentro da película, sendo um personagem no filme pronto. Era como se estivéssemos rodando em um telão naquele momento e tivessem pessoas assistindo. Como se eu estivesse dentro da grande tela... depois entendi que estava mesmo na tela, entretanto não era do cinema, mas tudo ali era transmitido ao vivo pela Globo. 


Naquele dia vi cenas que não se ver com detalhes durante as transmissões dos desfiles. Cenas como as baianas preparando as estruturas de suas anágoas, presenciei passistas esquentando o corpo, vi outros famosos que só via na televisão como Angélica e Luciano Szafir (eles no alto de uma alegoria setados para não chamar atenção...), Isabel Filardis (tocando chocalho na bateria), Daniele Winits belíssima (Rainha da Bateria), Luciana Gimenez (muuuito discreeeta - contém uma pitada de ironia - fungindo da imprensa, pois estava grávida, vestida de noiva de quadrilha - mostrando a barriga já bem crescidinha - e a impressa do mundo inteiro atrás de confirmar se o pai era mesmo o Mick Jagger).

Zezé Motta, Rainha do Maracatu. Grande Rio, 1999

Biné Gomes, Rei do Maracatu.  Grande Rio, 1999.


Naquele ano fiquei bobo com tantos famosos circulando entre a gente, no meio do povo. Meu transe foi ainda mais profundo quando mais à frente eu me deparo com ela... a figura preta mais linda, o sorriso mais acolhedor e a energia mais contagiante que possa existir no Brasil. Gente... Eu estava diante de Zezé Motta! Ela vestida de Rainha do Maracatu dando entrevista à Globo News. Sai de mim completamente. É como se meu espírito saisse do meu corpo e ficasse rodando e sobrevoando em volta dela ali... fiquei abobalhado vendo a eterna Xica da Silva e Dona Fátima - mãe do Jefferson que namorou Sandrinho na novela A Próxima Vítima, um marco na TV à comunidade gay -. Ela era ainda mais linda e simpática pessoalmente. Quando desligaram as câmeras ela olhou pra mim ali hipnotizado e me cumprimentou com um sorriso, piscou os dois olhos e fez um aceno com a cabeça. Foi quando eu despertei e lembrei que estava viajando escondido e me encontrava ao lado de uma equipe de jornalismo durante uma cobertura ao vivo em uma emissora do maior grupo de comunicação do país. A partir daí fui tendo o cuidado de me esconder das câmeras, como se eles fossem parar tudo só para me denunciar. Coisas que o medo de ser pego na mentira causa.


Eu passei o desfile olhando tudo, não sambei, não cantei... não andei. Foram o samba e as pessoas que me levaram até a dispersão onde despertei e lembrei que precisava subir no carro para ajudar Enoque a desmontar, embalar e descer a fantasia. Na subida ainda ajudei a "bunita" da Mônica Carvalho a descer do seu queijo, até pelo fato de que ela e sua fantasia estavam atrapalhando meu acesso até Enoque, meu orgulho maior naquele carnaval todinho. Terminei aquele desfile morto de cansaço causado por tanta emoção e uma, jamais experimentada, descarga de adrenalina. Eu não tinha preparo físico e emocional para tanto. Ninguém me disse como seria e, se tivesse dito, não teria eu conseguido imaginar como seria. 


Depois daquele outros carnavais já me levaram ao Rio. Aliás, depois daquele ano todos os outros carnavais me levaram à Marquês de Sapucaí. Pelo simples fato de que a cada ano tem-se novas experiências, novas visões, novas percepções, novas vivências. Cada ano é diferente do anterior. Para cada expectador a emoção bate de formas e em lugares diferentes. Nesse tempo que estou inserido nesta cena cultural prensenciei momentos que entraram pra história do carnaval carioca e eu fui uma das testemunhas oculares, acompanhando, se não a produção, mas vivindo o ápice que é o grande dia.


Por exemplo, nos anos 2000, algo que só tinha acontecidoem 1989, todas as escolas do grupo especial tiveram que desenvolver seus enredos em torno das comemorações dos 500 anos do Brasil. Cada agremiação pegou uma vertende e contou em verso, prosa, harmonia, alegoria e fantasia a construção desse país tão diverso. Depois disso vi em o sambódromo, que é um projeto de Oscar Niemeyer, ser reformado e ganhar novos setores com mais acomodações para um público cada vez maior.

Eric Scott, dublê americano. Grande Rio 2001.


Vi um dublê "astronauta" sobrevoar a sapucaí em três desfiles diferentes da Grande Rio - que barulheira aquela "maquina-mochila" fazia -. Presenciei Paulo Barros apresentar o lendário carro DNA pela Unidos da Tijuca, o que é considerado um marco no carnaval moderno. Ainda na Tijuca Paulo impactadou a todos com uma comissão de frente que trocava de roupa em fração de segundos diante dos olhos do público. Assisti ao desfile da Mangueira em que a comissão de frente "incorporava" grandes personalidade da escola, como se vivos estivessem. Por falar em Mangueira, eu vi Jamelão cantar e já estive em eventos com Dona Neuma e Dona Zica. E falando em grandes nomes, Enoque e eu andando pelo Saara, encontramos e tietamos Dona Dodô, a porta-bandeira número 1 da Portela.


Já entrando nos anos 2000, com o advento das possibilidades que os computadores traziam, e com os enredos patrocinados, posso dizer que foi interessante observar escolas começarem a usar tecnologia computadorizada - às vezes até equipamentos da NASA como o equipamento que fazia o astronauta voar nos desfiles - na produção de suas alegorias. Ainda assim, posso afirmar que mais bonito e satisfatório foi ver todas as escolas recorrerem a tecnologia artesanal da floresta amazônica, contratando e importando artesãos do Festival de Parintins em um itercâmbio cultural unindo as culturas brasileiras de ponta a ponta. Isso sim é fenomenal! Há profissionais que ficam seis meses construindo esculturas articuladas nas escolas de samba do Rio de Janeiro e outros seis meses em Parintins dando vida às alegorias dos grupos de Boi-bumbá amazonenses.


Como nem tudo é só alegria, presenciei os dramas das agremiações em períodos de chuva e riscos eminentes a desabamento ou incêndios nos antigos barracões da região do porto. Em compensação em 2006 constatei o impacto nos resultados gerados, tanto na autoestima dos componentes quanto nos trabalhos apresentados nos desfiles, pela mudança para a Cidade do Samba, que recebeu o nome de Joãosinho Trinta. - Aliás, vake registrar que conheci Joãosinho Trinta em 2001. Quando ele chegou à Grande Rio reencontrou Enoque - eles já se conheciam desde 1997 quando Enoque e Biné Gomes vestiram suas fantasias para lhe recepcionar em um evento no Ceprama em São Luís organizado pelo Governo do Estado. Esse evento rendeu a Enoque um convite para fazer parte de um grupo de brasileiro para shows na Europa que incluia a festa de comemoração pelos 700 anos de reinado da Familia Geimaldi de Mônaco -. No dia que conheci Joãosinho, em 2001, ao entrar em sua sala ele estava dando entrevista para ninguém mais, ninguém menos que a icônica jornalista Glória Maria. Caracas... eu tremia e não sabia qual dos dois mais me fazia tremer de emoção. A partir dessa aproximação ficamos amigos de João, inclusive acompanhamos sua saída da Escola - nessa ocasião ele chamou a seu encontro na casa de seus então empresários, depois de Niterói, onde estava em refúgio se esquivando dos contatos da imprensa nos primeiros dias da demissão conflituosa -. Ainda vou escrever posteriormente sobre coisas curiosas que vivemos e ouvimos de João Trinta. Muita coisa séria, algumas coisas graves, entretanto muita coisa divertida.


Em pleno 2004 também fomos surpreendidos com uma censura da igreja católica sobre a parte do desfile da Grande Rio com enredo "Vamos vestir a camisinha meu amor" de Joãosinho Trinta que conscientizava sobre a necessidade do uso da camisinha. Nesse desfile Enoque veio de "Deus Indiano" no carro do kamasutra, a alegoria censurada.

Enoque Silva Destaque da Alegoria Boi Mamão. 
Grande Rio 2011.

Cris Viana, Rainha de Bateria. Grande Rio 2011.


Eu estava lá em 2007 quando o abre-alas da Grande Rio pegou fogo logo na dispersão e precisou ser confeccionado um carro substituto em menos de uma semana para o desfile das campeãs. Foi triste, mas nem imaginávamos que o lano de 2011 foi ainda pior. Foi um ano marcante de forma triste à cultura carnavalesca. A Acadêmicos do Grande Rio estava quase pronta desde dezembro anterior. Faltavam poucas coisas para finalizar e, muita gente do meio falava, que era uma forte candidata ao título. No fato é que no dia 07 de fevereiro estávamos em casa, em São Luís, quando assistimos pelo "Bom Dia Brasil" a chamada ao vivo mostrando os barracões pegando fogo na Cidade do Samba. Estávamos a menos de 30 dias para o desfile oficial e três escolas foram atingidas, União da Ilha, Portela e a Grande Rio sendo a mais afetada. Em tempo recorde as equipes capitaneadas pela resiliência de Kahê Rodrigues com os comandos e articulação da diretoria da Grande Rio deram conta de por a escola na avenida com apoio das co-irmãs. No dia do desfile quando a escola entrou na avenida uma chuva torrencial caiu na Sapucaí que deixou a água da avenida na altura do meio da canela. E, mesmo sem concorrer, foi o melhor desfile da Grande Rio até então. Todo o público presente cantou e aplaudiu muito. A capacidade de se refazer em tão pouco tempo surpreendeu, contagiou e movimentou todos ali presentes. Esse desfile em especial eu passei todo atrás da alegoria do Boi Mamão, onde Enoque estava. Eu estava de olho no esplendor/costeiro da fantasia que curvou para trás com as forças da chuva e dos ventos associadas o peso da água que encharcou as penas da fantasia. Na minha cabeça a ideia era só uma... se o costeiro caísse eu saíria correndo e gritando pra não deixar ninguém se ferir. Ainda bem que nada aconteceu. Acabou nosso desfile, acabou a chuva. Assim, de repente e sem explicação. Foi de chorar de emoção. E 2011 ainda tinha um golpe final ainda mais cruel, em dezembro, fomos golpeados com a morte de Joãosinho Trinta. A cultura nacional ficou de luto com esta perda tão grande e irreparável.


Quando chegamos 2015 o carnaval carioca foi surpreendido por Viviane de Assis, uma mulher, preta, passista e que queria participar do concurso da corte de momo do carnaval carioca.Com 1,23m de altura por conta do nanismo, enfrentou as limitadas regras certame, mas brava como é fez um verdadeiro carnaval, deburrou regras e tabus e conseguiu concorrer ao posto de Rainha do Carnaval 2016.

Viviane de Assis, Passista pequena notável, 2015.


Paralelamente a tudo isso nossa vida em São Luís seguia com muitas histórias sendo experienciadas, tantos trabalhos incríveis feitos para grupos carnavalescos locais e tantos outros trabalhos relevantes apresentados no Rio de Janeiro que em 2016 vivi com Enoque o momento dele ser homenageado em nossa terra pela Escola de Samba Turma da Mangueira, que fica no bairro do João Paulo, onde moramos. Isso nos fez, pela primeira vez, desfilarmos na Sapucaí e na Passarela Do Samba de São Luís no mesmo carnaval. Uma logística louca dada a distância entre as duas cidades e os compromissos assumidos. Uma forma de agradecer à agremiação - em especial ao então Presidente da Escola, Carnavalesco e nosso amigo Itamilson Lima - pela linda homenagem feita com tanto zelo e carinho.


Foi também em 2016 que nosso amigo Milton Cunha, carnavalesco e comentarista da TV Globo, foi homenageado pela escola de samba britânica Paraíso School of Samba durante o Carnaval de Notting Hill e nos convidou para acompanhá-lo e participarmos do desfile que tinha o enredo "Rio Carnival through the eyes of Milton Cunha" - "O Carnaval do Rio pelos olhos de Milton Cunha"-. Um desfile que durou uma 3 horas pelas ruas de Londres.

Enoque Silva, Destaque Central alto.
Grande Rio, 2017.


O ano de 2017 a explosão foi a homenagem da Grande Rio a cantora baiana Ivete Sangalo. Que em ato de retribuição a tudo feito por ela fez questão de desfilar fazendo parte da Comissão de Frente - performando e sendo avaliada como todos os demais componentes - e de vir também no lugar homenageada no último carro. Os bastidores foi uma correria louca, surpreendente e emocionante.


Depois disso, após o carnaval de 2020, o mundo parou por conta da pandemia de Covid-19. Nossos corações deixaram de bater no ritmo da bateria. Nosso ouvidos só ouvia a batida solitária e triste do surdo... e cada vez mais distante. Foi então que recebemos com tristeza a confirmação do já esperado cancelamento dos desfiles em 2021. Não havia o que fazer quanto a isso. Então reagimos e aproveitamos o momento para organizar a "Exposição Virtual Bonecas em Destaque" - no perfil de Instagram (@enoqueosilva) de Enoque - apresentando 52 modelos de miniatura de fantasias de destaques em homenagens a grande nomes do carnaval brasileiro, personalidades do Norte ao Sul do país. Conseguimos aquele ano, com a ajuda de amigos, movimentar a cena carnavalesca brasileira. O trabalho foi matéria em diversos jornais pelo Brasil, inclusive no RJTV. Notoriamente não foi à mesma coisa dos outros carnavais, entretanto foi um carinho nos corações apaixonados pelos desfiles que não tivemos àquele ano.  




Bonecas da Exposição Virtual Bonecas em Destaque, 2021.

Como tudo passa, no ano seguinte, 2022, o país teve a felicidade do retorno dos desfiles, que aconteceu no feriado de Tiradentes. Foi nesse ano que depois de 23 carnavais desfilei em um enredo campeão. A Grande Rio foi a campeã daquele ano. Conquistamos nosso primeiro título no Grupo Especial. Um enredo contra a intolerância religiosa que levou a Sapucaí ao delírio com o enredo “Fala, Majeté! As sete chaves de Exu!”, desmistificando a imagem de um dos orixás mais cultuados nas religiões de matriz africana. Aquele desfile foi diferente. A escola estava diferente. Todos os setores organizados, os diretores não estavam dando ataque de estrelismo como sempre faziam. Todos estavam dispostos e a disposição de colaborar com quem estava precisando de ajuda. Ninguém estava pensando somente em seu umbigo ou no seu momento. Todos estavam voltados para o grande momento da Escola de Caxias. Pela primeira vez eu vi os diretores deixando a Acadêmicos do Grande Rio ser a estrela e brilhar sozinha. E foi muito mais que perfeito. Ganhamos!


Iluminação cênicas da Sapucaí, 2024.


Em 2024 testemunhei também - junto com o público presentes - o inicio do uso de iluminação cênicas na Marquês de Sapucaí durante os desfiles. Não se trata de uma luz específica conforme as necessidades de cada enredo desfilado e sim de uma iluminação específica para cada setor do desfile, que acompanhava o avançar de cada escola pela avenida. O espetáculo cresceu e o público ganhou ainda mais elementos surpresas durante cada apresentação. Foi o início de uma nova era.



Blocos de Carnaval de Rua. 
Anita, Lud e tradicional Bola Preta.


Todos estes anos eu vi surgir no Rio uma folia mais variada e democrática no período momesco. O movimento Escola de Samba, dentro de uma polêmica ou outra, cresceu. E me assustei com o crescimento do carnaval de rua com as bandas e trio arrastando multidões de milhões de pessoas na rua. Crianças, adolescentes, jovens, velhos, solteiros, casados - e até seus pets - saem de casa fantasiados de manhã, vão emendando de bloco em bloco e só retornam à noite.


Percebi ainda a diminuição dos grandes, famosos, glamourosos e caríssimos bailes e concursos de carnaval da cidade do Rio. A falta desses eventos que eram esperados pelo Brasil inteiro fez Milton Cunha criar o Baile Glam Gay fazendo um resgate dos concursos de fantasia de luxo e originalidade, como nos velhos carnavais cariocas, onde personalidades com Clóvis Bornai, Wilsa Carla, Eloy Machado, Isabel Valença, Evandro de Castro - e que eu só conheci pelas páginas da extinta Revista Manchete.

Milton Cunha e seus convidados do Baile Glam Gay, 2020.


Como tudo na vida tem os "do contra" e contrariar estes haters é preciso. Então, vamos lá... desfile de escola de samba não é sempre a mesma coisa. Quem acompanha de fato os desfiles das Escolas de Samba a cada ano se surpreende com as novidades que são descobertas desde as pesquisas de enredo até os dias dos desfiles. Vemos inovação e originalidade apresentadas a cada temas e enredos distintos. Tudo é feito através de processos de criação e execução diferentes. Anualmente somos magnetizados com tecnologias diversas, inovação nas técnicas de confecção, novos estilos de bordados e materiais mais práticos e sustentáveis. Quero acreditar que as agremiações ano após ano estão entendendo a importância das homenagens às figuras e personalidades notáveis que foram marginalizadas ou apagadas pelos brancos contadores da história.


As Escolas de Samba e o carnaval brasileiro tem galhos e folhas de várias cores, mas a sua raiz e o seu tronco são pretos e nas cores do arco-íris. E o que é o ponto forte desta festa toda e deveria ser ainda mais fortalecido encontra uma grande fragilidade. As escolas, e o público, não estão entendendo seu papel social principal que seria enaltecer a participação e valorização o protagonismo daqueles que construíram tudo isso, proporcionando mais igualdade e garantias de direitos tanto raciais quanto dos LGBTQIAPN+. Foi essa gente que criou e construiu tudo isso e é essa gente que segue dando o suor, o sangue e até a vida pela escola. Mas, os lugares principais e de destaques são dados - e até vendidos - a pessoas que tem dinheiro, mídia e visibilidade. Estes, na maioria das vezes, só atrapalham os desfiles, pois não cantam, não dançam, não evoluem e nem são simpáticas.


Apesar dos pontos fracos não há como dizer que o carnaval carioca não seja bom, feliz ou que já deu o que tinha que dar. É inegável a grandiosidade que o carnaval brasileiro alcançou sendo fruto da força, do suor, da energia e da alegria do povo preto e da comunidade LGBTQIAPN+ do Brasil. Se houver uma coisa que posso afirmar sem medo de errar, eu digo viver a experiência de um desfile de escola de samba, em qualquer lugar do país, dá um um orgulho danado de ser preto e de ser brasileiro. Imagine conhecer e viver sendo parte desta história. É justamente aí que percebemos a força de nossos ancestrais e que nos dar a certeza que o povo preto é foda! Não há como não se orgulhar! Já é 2025 e Já já estaremos na Sapucaí novamente. Será o 31⁰ carnaval de Enoque no Rio de Janeiro, 27⁰ ano dele na Grande Rio e o no nosso 26⁰ carnaval juntos. E esse ano a Mina é cocoriô!!!



domingo, 5 de janeiro de 2025

FUI PARA CODÓ E ME ACABEI NA SAPUCAÍ

 Autor: Rivanio Almeida Santos

Carro abre-alas da Acadêmicos do Grande Rio, 1999.

      As pessoas não fazem ideia do que é ser uma criança com espírito ligado em tambores preso a uma religião evangélica. E fazem menos ideia ainda do que é ser uma criança gay, sensível aos toques do tambor e ser induzida a ser de uma igreja evangélica tradicional em uma cidade pequena no interior nordestino onde a vida de cada um "é da conta" de qualquer um.

     Desde muito cedo, mesmo quando era obrigado à frequentar a escola dominical, ao passo que ia me descobrindo diferente dos meus colegas - nos gostos musicais, nos assuntos de conversas, de brincadeiras, na forma de falar e nas paixonites infantis - entre elas percebi que batuques de tambores faziam uma espécie de hipnose em meu cérebro e tinha um certo domínio sobre o meu corpo um tanto afeminado. Os irmãos da igreja ao perceber algum sinal de afeminação de um menor eles já transformam a situação em tentativa de abafamento da sexualidade através da condenação à passar a eternidade no fogo do inferno. Com isso a confusão mental auto condenatória está formada.

Capa do LP Olodum ‎– The Best Of Olodum - usado para as oficinas de Dança Afro.

         Apesar de ter enfrentado tudo isso, olhando para trás, eu tive duas sortes às quais serei grato eternamente. Vou começar pela minha segunda sorte que foi ter os três irmãos mais velhos muito ligados a movimentos sociais e que juntos com seus amigos do colégio cresceram sob o lema da escola comunitária que dizia "estude para ajudar seu povo". Isso lhes deu a consciência de que era preciso fazer algo para ocupar o tempo, desenvolver autoconhecimento empoderamento - antes desta palavra existir - e um nível de conhecimento cultural pensando na responsabilidade que eram ser referência às gerações futuras na nossa cidade. Por conta disso, foi criado um grupo de alunos e ex-alunos - o Grupo Chama - que levava de São Luís ao interior seminários, rodas de conversas paletras de temas importantes - já naquela época - para se chegar aos objetivos aos quais se justificava a criação do grupo. Além disso, eram oferecidas oficinas de serigrafia, teatro, Bumba-meu-boi (batida dos pandeirões, bordados e danças), dança afro e percussão. Eu participei de todas as oficinas, mas, com mais afinco e satisfação dos dois últimos que tinham tambores... não pelo fato de eu gostar de bater ou tocar tambor - as tentativas foram desastrosas - , mas é que eles faziam minha alma dançar e eu soltar meu corpo tão novo e tão travado pelas imposições alheias.

          A outra bem-aventurança foi o pai que tive que, durante minha infância, não tinha religião e nem restrições de amizades com quem quer que fosse por conta de religião. Além disso, ele sempre teve um gosto musical muito apurado para alguém que só estudou até o 3⁰ ano primário (hoje ensino fundamental). Fomos criados ouvindo Luiz Gonzaga, Ângela Maria, Cauby, Nelson Gonçalves, Bezerra da Silva, Beth Carvalho, Agepê, Martinho da Vila... e diversos outros grandes nomes do choro e do samba -. Recordo muito bem do LP das Escolas de Samba do Rio de Janeiro de 1987, que eu ouvia todos os carnavais da primeira a última faixa do lado A e do lado B. Foi com meu pai que eu aprendi a gostar de carnaval de Escolas de Samba. Não que ele me levasse para alguma, pois na cidade não tinha. Recordo que após às 22h, quando baixava as portas de ferro da farmácia, tomava seu banho e ia assistir TV para relaxar a mente e "descansar as pestanas", como ele dizia ao negar que tivesse cochichando. Papai se empolgava com os desfiles, com a genialidade de Joãosinho Trinta, os enredos bem fundamentados, os sambas épicos, voz de Jamelão e o carisma de Negrinho da Beija-Flor. Esse ritual aconteceu até completar meus 15 anos, quando mudei para São Luís e papai ficou na nossa Santa Teresa do Paruá.

Capa do LP Sambas de Enredo das Escolas de Samba Grupo 1A (Especial) do Rio de Janeiro, 1987.

        O tempo foi passando, segui estudando para o vestibular e dezembro de 1997, quando aos 18 anos quis o destino que eu me apaixonasse e começasse um relacionamento com um rapaz chamado Enoque Silva que, mesmo sendo maranhense e residindo em São Luís, era carnavalesco, destaque de carnaval no Rio de Janeiro e eu não o conhecia. Enoque começou na Sapucaí pela Unidos da Ponte no enredo que homenageou a Marrom. Naquele ano ele foi o primeiro destaque a entrar na avenida com uma fantasia gigantesca - a segunda que ele criou para esta função naquele carnaval, pois a primeira o carnavalesco, Washington Luiz, gostou tanto que ficou para transformar em fantasia da comissão de frente e de outro setor do desfile.

         Naquele dezembro de 1997 em que nos conhecemos ele já estava prestes à viajar para mais uma temporada no que é o maior espetáculo da terra e iniciar sua ligação com a Acadêmicos do Grande Rio. Logo já seria 1998 e não naquele ano pude acompanhar naquele que poderia ser o nosso primeiro carnaval juntos. Nos conhecemos a menos de 2 meses da viagem. Restou-me, acompanhar tudo pela televisão como sempre fiz. A transmissão não lhe mostrou como eu gostaria, mas aos olhos de um apaixonado foi tudo lindo. No ano seguinte, já com o relacionamento fortalecido - apesar de escondido da família -, ele planejou tudo para eu o acompanhar na temporada de 1999. Eu iria realizar um sonhonque nem cheguei a ousar a sonhar, tão distante eu achava ser. Mas, como conseguir permissão do meu pai e da minha mãe? Eu ainda não tinha passo no vestibular, nao trabalhava ainda? Como dizer que eu iria ao Rio de Janeiro "brincar" carnaval com meu namorado? Só havia - e ainda existe para muitos de nós - uma única saída nessas ocasiões... Eu precisava pôr em prática a primeira lição do "manual de sobrevivência" da comunidade LGBTQIAPN+, a criação de um enredo fictício, mais conhecida como uma desculpa esfarrapada, uma história fantasiosa, enfim, a mentira. Que fique claro, é. nossa comunidade o ato de mentir surge como um ato de sobrevivência, defesa da integridade física, defesa da vida, resistência e tentativa de viver e ser feliz, mesmo que por momentos curtos. Só pra ilustrar: Estes primeiros dias de 2025 repercutiu a história de um rapaz cearense que passou em primeiro lugar em curso de uma Universidade Federal e foi orgulho pra toda família. Depois disso criou coragem e se assumiu gay aos pais, que não aceitaram o expulsaram de casa pelo simples fato de amar alguém do mesmo sexo... muitas vezes é sobre se proteger.

          Bom, voltando a viagem ao Rio de Janeiro... Quando estava me preparando para esta grande aventura e o dia de viajar estava se aproximando eu disse em casa que iria auxiliar um amigo na produção de uma decoração de Carnaval na cidade de Codó, na região dos cocais maranhense, - a escolha da cidade foi após calcular o tempo de voo -. No dia da viagem, que também contava com a companhia de Biné Gomes, outro maranhense destaque de carnaval que iria debutar na Grande Rio àquele ano, fomos ao aeroporto. Pouco tempo após despacharmos as bagagens dou de cara com Roberto Costa - hoje prefeito de Bacabal -, sobrinho do marido de minha irmã mais velha, Rogener. Ele nos cumprimentou e eu respondi com a cara e o corpo desconfiaaaaados como quem estava fazendo algo errado - será se estava? - Quando adentramos a sala de embarque encontro outro conhecido meu e da mesma irmã. Dei de cara com Lobão. Ele foi meu Professor de Biologia no Colégio Santa Teresa de São Luís, onde minha irmã Rogener era Coordenadora Pedagógica. Eu apavorado, mas tentando manter a calma, fui à cafeteria onde ele se encontrava na fila do caixa. Eu, tremendo e de cara pálida, o cumprimentei e pedi que mantivesse aquele encontro em segredo. E a primeira coisa que ele fez ao voltar para juntos da namorada que o acompanhava na viagem foi contar nossa conversa. Eu li os lábios dela perguntando "e ele vai viajar?". Já era tarde para eu desistir.

Enoque Silva e eu, na minha primeira viagem ao 
Rio de Janeiro, 1997.

      Em poucas horas estava eu desembarcando no Galeão após o Boing 737-300 da TransBrasil ter me levado por Belém, Manaus e Brasília. Só faltou o Tom Jobim tocando piano e cantando uma bossa nova para minha chegada no aeroporto que leva seu nome. Mas, na falta dele eu o imaginei cantando "Corcovado" - "Um cantinho e um violão. Este amor, uma canção. Para fazer feliz a quem se ama..." - Eu estava feliz!!! Apesar de tenso, eu estava muuuuito feliz! Eu estava na Cidade Maravilhosa!

     No dia seguinte antes do almoco já estaríamos entre os barracões na região do porto (não existia a cidade do samba ainda) na companhia de Max Lopes e Danyllo Gayer, então Carnavalesco e Diretor de Destaques da Grande Rio, respectivamente. Eu estava sentido pela primeira vez - e sinto nesse instante que escrevo este texto - o cheio de barracão que é uma mistura fumaça de solda e cola de sapateiro que me remete a grande produção cultural, isso me gera uma satisfação gigantesca. 

       Todos os dias eu ligava para casa do telefone público do Hotel Vitória, no Catete, onde estávamos hospedados. Também todos os dias eu contava uma mentira ou apenas dizia que estava bem para não me pegarem na mentira e dizia que a fila do orelhão estava grande para desligar rápido.

Alegoria Maracatu, a parte da frente a gigante saia de Zezé Motta como Rainha do Maracatu. Grande Rio, 1999.

Biné Gomes, como Rei do Maracatu  Destaque da Alegoria Maracatu. Grande Rio, 1999.

          No dia do desfile a ansiedade me consumia. Minha boca secava... eu não conseguia beber nada... eu tinha vontade de fazer xixi... eu não tinha o que urinar. Sabe aquela borboleta no estômago? Eu tinha um borboletário inteiro. Somente quando cheguei à concentração fui realizando a dimensão real que era todo aquele universo. O que vemos na TV é ínfimo, nunca é compatível com o que vimos e, principalmente, com o sentimos lá, ao vivo. Indescritível o que acontece com nosso coração quando a bateria começa a esquentar. Só estando lá!!! Eu tive lá e nunca mais deixei de estar. Eu olhava em volta e o que via eram as alegorias cercadas por milhares de pessoas sorrindo. Naquele mundaréu de gente feliz eu só conhecia Enoque e Biné e parecia ser amigo de todo mundo. Como, além de namorado, minha função no desfile era de Apoio de Destaque, ajudei Enoque a subir na alegoria que representava um sertão nordestino com terra seca e uma grande caveira bovina no centro. Ajudei ele a se montar e assisti a chegada das composições do carro que contava ali com as presenças, entre eles, de alguns famosos como dos atores Raul Gazolla, Beto Simas e da atriz Mônica Carvalho. Fantasia montada, Enoque pronto no alto do carro alegórico eu desci do carro e enfrentei aquele meio mundo de gente desconhecida. Atônito. Lunático. Desacreditado ainda no que estava vendo, vivendo e sentindo. Literalmente ficava me beliscando no braço e na coxa para me certificar que era real. Decidi ir até a alegoria onde estava Biné - acho que a 7ª alegoria, pois naquela época as agremiações desfilavam com cerca de 8, 9, 10 alegorias. Meu transe foi profundo quando mais à frente eu me deparo com ela... a figura preta mais linda, o sorriso mais sincero e a energia mais contagiante que possa existir no Brasil. Gente... Eu estava diante de Zezé Motta! Ela vestida de Rainha do Maracatu dando entrevista à Globo News. Sai de mim completamente. Foi como se meu espírito saísse do meu corpo e ficasse sobrevoando em volta dela ali... fiquei abobalhado vendo a eterna Xica da Silva e Dona Fátima - mãe do Jefferson que namorou Sandrinho na novela A Próxima Vítima, um marco na TV à comunidade gay -. Ela era ainda mais inteligente, linda, elegante e simpática pessoalmente. Quando desligaram as câmeras ela olhou para mim ali hipnotizado e me cumprimentou com um sorriso, piscou os dois olhos adornados com gigantescos cílios postiços e fez um aceno com a cabeça. Foi quando eu despertei e lembrei que estava viajando escondido e me encontrava ao lado de uma equipe de jornalismo durante uma cobertura ao vivo em uma emissora do maior grupo de comunicação do país. A partir daí fui tendo o cuidado de me esconder das câmeras, como se eles fossem me denunciar. Coisas que o medo de ser pego na mentira causa.

Enoque Silva (vide seta), no topo do carro abre-alas. Acadêmicos do Grande Rio, 1999.

         Naquela viagem, em especial naquele desfile, senti vibrações nunca vivenciadas ou sentidas antes. Após toda essa experiência, cheguei à conclusão que o povo brasileiro criou o samba e o seu Carnaval diferenciado do resto do mundo para esquecer, mesmo que por algum dias, todo e qualquer problema, ainda que por vezes o enredo seja denunciando um ou outro - ou todo e qualquer - problema que nos maltrata ainda nos dias de hoje.

Desfile da Acadêmicos do Grande Rio, 1999.

      Passados quase 15 dias vivendo o Rio de Janeiro retornei para casa cheio de novidades e assuntos, no entanto não podia falar ou comentar nada. Sempre que ouvia a palavra "Codó" eu escapulia do ambiente. Assim foi até o primeiro fim de semana após minha chegada, quando minha irmã Rogener com o marido - o tio do Roberto que me flagrou no aeroporto - foi nos fazer uma visita na casa onde eu morava com os demais irmãos solteiros. Durante o tradicional cafezinho oferecido a meu cunhado ele lança a flecha:

    - E então Rivanio, como é Codó?...

Senti como se ele já soubesse de tudo, o que nunca confirmei. O meu sistema respiratório deu uma pausa de segundos. Quando voltei joguei a respostas sem nem pensar:

       - Ora, Costa... como toda cidade do interior do Estado. Uma rua que entra, uma rua que sai e uma igreja entre as duas ruas. Respondi tentando controlar o tremor da voz e a suadeira das mãos enquanto me levantava e saía da sala antes que vissem na minha cara que eu não sabia nem que estrada leva de São Luís à capital da macumba e terra de Bita do Barão. 

        Só sei que retornei vidrado nas inovações de cada enredos. Tudo feito através de processos de criação diferentes. Minha percepção naquela época era que escolas - ano após ano - seguiam entendendo seu papel social e acolhendo ainda mais a participação das minorias e valorizando o protagonismo em busca de igualdade racial, os direitos LGBTQIAPN+, além das homenagens às figuras e personalidades importantes que foram marginalizadas ou esquecidas pela história. Hoje sinto que este lugar é somente para construção da base e dos alicerces das plataformas que servem para dar ainda mais destaque a brancos, héteros e/ ou famosos que lhe traram mais visibilidade midiática.

         Após esses momentos iniciais de vivências, experiências e cumplicidades meu relacionamento com Enoque encontrou mais afinidades, ficamos ainda mais cúmplices, criamos mais confiança e eu me senti mais forte para aos poucos me reconhecer, reafirmar minha minhas preferências, me assumir e impor o respeito necessário. A partir do carnaval do ano 2000 não precisei mais mentir. Não precisei mais me esconder ou tentar disfarçar ser o que nunca fui. 

Trecho desfile Acadêmicos do Grande Rio, 2024.

  Em dezembro de 2024 completamos 27 anos de relacionamento, temos uma filha de 28 anos formada, moramos com sua mãe. Vivemos todos com amor e respeito. E no carnaval de 2025 estaremos na Sapucaí no nosso 26⁰ carnaval juntos. Desta vez estaremos em comemoração ao 31º carnaval de Enoque no Rio de Janeiro. E seguiremos, pois o carnaval é uma das paixões que seguem alimentando nossa união.


Imagens com alguns amigos conquistados nos meus 26 carnavais cariocas: