domingo, 26 de dezembro de 2021

PUREZA  UM FILME SOBRE A CRUELDADE HUMANA E A FORÇA DO AMOR DE UMA MÃE

 

Cartaz divulgação do Filme Pureza
 

A cidade que nasci, Santa Teresa do Paruá, interior do Maranhão era pequena, bem pequena. De forma que todos nós da cidade éramos próximos e nos conhecíamos bem uns aos outros. Tínhamos vizinhos extraordinários, de histórias de vida que de um certo tempo passaram a me chamar atenção pelo grau de dificuldade, de lutas e de vitórias ou superações para criarem suas promessas de vários filhos - não lembro de nenhuma família com filho único.

Obviamente que ainda criança eu não observava com esse olhar, pois era o comum, o normal o meu dia a dia. Contudo, a partir do momento em que meus irmãos mais velhos, já morando em São Luís, começaram a trabalhar com questões sociais - pondo em prática o "estude para ajudar seu povo - e começam a trazer para dentro de casa assuntos e discussões da realidade além da vizinhança meu olhar passou a ser mais observador e empático.

Produtos da Roça no Maranhão
(Fonte: Facebook "Enquanto isso no Maranhão)

Meus irmãos traziam assuntos sobre o ECA - Estatuto da Criança e do Adolescente -, seminários com professores pelos interiores do Estado, a vida dura do agricultores, das quebradeiras de coco, pescadores, garimpeiros, violência contra a mulher,  homofobia... enfim. A medida que ouvia as conversas  eu fazia a associação das profissões e das vidas dos personagens das histórias com os meus vizinhos. Assim comecei a entender as dificuldades reais e ter ainda mais respeito, consideração e admiração pela história das pessoas com quem convivia, minha gente.

Me refiro a fins dos anos 80 e início dos anos 90 do século XX. Nesse período minha irmã Rogenir, a quem chamo carinhosamente de Genir, em uma de suas passagens por Santa Teresa - não recordo se feriados, férias ou eleição, quando ia votar - então estudante do Curso de Direito da UFMA, já ativista de movimentos sociais e engajada em causas justas trouxe uma história parecida com tantas que já tinha ouvido falar, porém com um agravante extra que me deixou chocado e que, anos depois soubemos, teve um desfecho emocionante.

Dona Pureza, maranhense que denunciou o trabalho escravo e virou filme (Fonte: Internet)


A história dizia respeito à uma senhora da cidade de Bacabal, também interior do Maranhão, que com muito sacrifício criava o filho. A uma certa altura da vida o filho dessa senhora ver-se diante de um sentimento de buscar vida melhor e quem sabe de ajudar sua mãe. A solução encontrada seria viajar ao Pará em busca de trabalho em uma grande fazenda, que prometia emprego e boa remuneração.

Após chegar em Itaituba (PA), seu destino, o filho deixou de dar notícias deixando a mãe mais que preocupada, desesperada. Como uma mãe, ela vai em busca de notícias e, aos poucos, ela vai descobrindo que o filho estava sendo vítima de tráfico humano, estava sendo obrigado a trabalhos análogos a escravidão e vivendo em condições sub-humanas. Como um leoa em defesa da cria não se intimida e voa o Brasil e o mundo denunciando as crueldades dos fazendeiros, com apoio de políticos corruptos sobre pessoas pobres em busca de sobrevivência.


Ação policial libertando homens escravizados em fazendas no Pará nos anos 90 (Fonte: Internet).


A luta dessa mãe enfrenta criminosos, estremece Brasília, escandaliza o mundo, mas, criações ações federais, muda realidades, cria leis, liberta seres humanos, prende desumanos e vira filme, Pureza.

Apresentado em diversos Festivais pelo mundo, o filme Pureza, que também é o nome da mãe,  é um drama biográfico nascido a partir de ideia original de Hugo Santarém foi escrito por Renato Barbieri e Marcus Ligocki e dirigido por Renato Barbieri.

O filme tem Dira Paes como protagonista - dando um show como D. Pureza -  conta com Matheus Abreu - como Abel, filho de Pureza -, Marinana Nunes, Flávio Bauraqui, Cláudio Barros e Sérgio Sartorio no elenco, além da participação especial de vários homens que foram personagens reais da história de escravidão na época e de pessoas importantes na luta contra a escravidão, abolicionista no Brasil atual, uma delas minha irmã Genir.

Pureza já fora premiado como Melhor Filme júri popular Mercosul no FAM 2020 e o Grande Prêmio do Público no Rencontres du Cinema Sud-Américain na França. Além disso nos EUA no Inffinito Film Festival de Miami e NY, o filme levou a categoria técnica de fotografia e nossa Dira Paes conquistou a estatueta de Melhor Atriz, assim como no Seattle Latino Film Festival. Não é para menos, o filme tem um um primor de realidade e qualidade em todo o conjunto da obra, o enredo é emocionante, ainda mais por se tratar de história real tão perto da gente, tanto por se tratar de conterrâneos maranhenses quanto pela época que tudo ocorreu, 1993 - eu fazia q 7ª serie (8° ano de hoje) e para se ter uma noção, meu sobrinho mais velho, o Lucas nasceu em 1992.

Pela telinha do meu smartphone assisti ao filme por duas das vezes em que o longa-metragem esteve rodando em festivais e que, nesse período pandêmico, ficou livre na Internet. Nas duas vezes que assisti me emocionei muito... leia-se de chorar horrores. Me deixa sempre uma sensação de poderia ser eu ou um dos meus irmãos, um primo, um vizinho... contudo, não deixa de ser um pouco de cada um deles e inclusive de mim mesmo, pois é uma pessoa do meu tempo, maranhense de uma cidade que conheço e com uma vida igual a de tantos amigos, vizinhos e parentes. Impossível passar insensível ao Pureza.

Trailer oficial de Pureza, o filme

Além das conquistas da luta contra a escravidão iniciadas por D. Pureza, da história inspirar um lindo filme, dos prêmios recebidos mais boas notícias vão sempre chegando. E a mais nova é que o longa chega no início de 2022 aos cinemas de todo o pais. Eu estou esperando como se eu nunca tivesse assistido, pois vou sim assistir Pureza nas telonas.

E se eu fosse você, eu também iria!!!
Você vai ver do que o ser desumano é capaz e o que o poder do amor humano e materno faz.

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