Foto: Maria do Neuton. Fonte: Eletilce Araújo
Nesta Semana Santa não viajei e nem viajarei. Estou
vivenciando uma Páscoa de reflexão e avaliação. Em casa, mas longe do que hoje
parece ser normal e tradição, a troca de ovos de chocolate estimulada pela
indústria e pelo comércio. Mas, sempre
ligado às mídias para acompanhar o que tem acontecido no mundo aí fora. E foi justamente
em uma dessas que me deparei com uma foto postada por uma amiga e uma rede
social. A foto mostra outra grande amiga ao lado de uma mesa coberta de bolos. Imediatamente
embarquei uma viagem no tempo. Voltei pelo menos 25 anos.
O então Santa Teresa do Paruá era um lugarejo distante da
capital maranhense e pouco conhecido. Cidade pequena onde a união, a comunhão e
fraternidade dos moradores sempre foram marcas fortes. Terra de pessoas
preocupadas com a educação de seus filhos, ligados a religiosidade, respeito mútuo,
bom humor, gratidão e hospitalidade mesmo que a vida fosse difícil. Distante do
consumismo induzido pelas indústrias através das grandes mídias. Afinal, ali,
quase a totalidade das pessoas só assistia televisão entre as 18 e 22 horas,
tempo em que o gerador de energia, do amigo João José, ficava ligado. Mas, como
era particular nem todos tinham energia elétrica e aparelho televisor em suas
casas por falta de condições financeiras. Eram épocas em que as casas onde
tinham o transmissor ficavam lotadas de amigos e vizinhos, em especial dia de bons
filmes, jogos e final de novelas. Tempos bons e de proximidade de um bando de
críticos e comentaristas natos.
Nessa época
as escolas, públicas e comunitárias, trabalhavam de forma mais intensa o significado
do período pascal, da morte e
ressurreição de Cristo. Na semana anterior eram sempre lidos e debatidos versículos
da Bíblia Sagrada, passagens importantes da vida do Filho de Deus. Eram momentos
onde cantávamos músicas das igrejas católicas e protestantes em comunhão por um
só Pai Celestial. “Como são belos os pés do mensageiro que anuncia a paz. Como
são belos os pés do mensageiro que
anuncia o Senhor” e “Me chamaste para
caminhar na vida contigo, decidi para sempre seguir-te, não voltar atrás. Me
puseste um brasa no peito e uma flecha na alma , é difícil agora viver sem lembrar-me
de ti. Te amarei Senhor, Te amarei Senhor eu só encontro a paz e a alegria bem
perto de ti” são trechos de duas das canções
que mais me emocionam, pois me lembram as cerimônias de lava pés que nós, alunos, organizávamos em nossas salas. Eram
mais que simples representação de uma passagem bíblica. Eram aulas práticas de
humildades, de igualdade e fraternidade.
Cada um dos
alunos levava um elemento importante para a ocasião tais como o peixe frito –
que não era bacalhau e sim peixe de água doce da região -, pão, suco de uva
tomando lugar do vinho, a taça, a bacia, toalha de mesa, a tolha para secar os
pés, as palhas de palmeirinhas para decorar a sala junto com o papel higiênico
que jogadas sobre os caibros e tesouras do telhado viravam parte da
decoração... Este último foi ensinado pelo querido Professor Ir. Reinaldo
Oliveira. Era tudo ingênuo, mas lindo e emocionante. Lindo!
Por perto
sempre tínhamos a ajuda e o apoio dos professores e, principalmente, das
senhoras que cuidavam da cantina como Dona Luzia do Bebé, Dona Deusa e Dona
Maria Juca. Dentro desse contexto foram meus professores de sentimento pascal,
além das matérias tradicionais, Dona Mariazinha, Diquinha, Angelita, Domingas,
Eunice, Coimbra, Francisco Magalhães, Dolores, Brígida, Carlos, Verônica,
Edinéia, Telma, Edna, e os irmãos La
Salle Odyllo, Dionísio, Renato, João Angelo, Jardelino, Rosalino, Curru e tantos
outros que tiveram passagens mais rápidas, mas não menos importante.
Paralelo ao
que aprendia na escola em casa aprendia que era tempo de reflexão e
principalmente de união e fraternidade. Todo ano vinha de Belém Dona
Francisquinha, uma avó postiça, com eu neto, meu amigo Santídio, primo de
consideração, que junto aos seus e meus primos, além de outros amigos de nossa
rua fazíamos a semana se tornar período de férias. Era tempo de alegria,
diversão, passeio, banhos de açude e muita comida.
Recordo dos
nossos passeios no terreno do Soares e da Netinha, de onde trazíamos muito
milho e macaxeira. E o que não vinha de lá nós sempre comprávamos como tapioca,
arroz e massa puba. Era preciso pilar arroz e babaçu no pilão e ralar coco seco
e o milho nos raladores feitos de lata de óleo perfurados com pregos e presos
em pedaços de tábuas.
Minha mãe,
Terezinha, Dona Francisquinha, Nete, Netinha, Maria do Neuton, Maria de Santinho, Chica, Francisca, Delina Todas em
suas cozinhas preparando bolo de macaxeira, bolo de puba, bolo de milho, bolo
de tapioca torrada, bolinho frito de tapioca fina, pamonhas, canjicas e mingau
de milho. Era tanta comida que dava para passar a semana inteira comendo. E, embora
todas fizessem os mesmo pratos, havia a troca dos pratos. Eu adorava provar as
variações de receitas feitas por todas elas. Para acompanhar os sucos de
acerola, de cupuaçu, bacuri, laranja, manga, café, leite de vaca – minha
predileção - ou café com leite.
Em casa não
tínhamos quase nada de chocolate, salvo alguns bombons garoto, o nescau nosso
de cada dia e, muito raramente, os ovos de páscoa chegavam até nós, pois nem
sempre meus irmãos iram passar este período conosco. Entretanto, nossa páscoa
era feliz e com os frutos dessa terra que tudo dar. Não tive a páscoa que meus
amigos da capital tiveram, com os muitos ovos, camarão, caranguejo e bacalhau,
mas garanto que tive ricas páscoas. Com ricos ensinamentos, lições e exemplos
práticos eu cresci e tudo isso são parte
da base para continuar tentando acertar nas minhas atitudes e ações. E toda
esta viagem é por conta da foto que minha amiga Eletilce postou de nossa amiga
Maria do Neuton.
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