domingo, 19 de maio de 2024

TEM COISA QUE SÓ PERDOANDO...

 A psicóloga que me acompanha nos últimos meses, sabendo que escrevendo eu consigo coordenar meus pensamentos, pediu para eu escrever um texto sobre o PERDÃO.  Sim, sou um tanto quanto difícil de rancoroso. Bom... não é que eu não tenha capacidade de perdoar, a questão é que o meu tempo para isso é demorado e, enquanto não ocorre, eu fico afetado psicologicamente, o que por vezes tem consequências no meu organismo e até na minha vida social. Então, dada a tarefa, passei a semana pensado sobre o tema e alguns aspectos de minha vida.

Eu, Rivanio, aos 8 anos de idade.

Cresci com o exemplo de minha mãe que sempre foi de perdoar. Ela sempre falou da passagem bíblica (Mateus 18,21-35) em que o Apóstolo Pedro perguntou a Jesus quantas vezes devo perdoar uma pessoa que me ofend, se até sete vezes. Jesus então  responde a Pedro: “não te digo até sete vezes, mas até setenta vezes sete!”. Minha mãe pratica isso e sempre nos ensinou isso. Porém, viver é difícil e acaba quase sendo um "minhas dores, minhas regras".


Para começar, como já disse em outros textos, desde muito cedo me percebi diferente de todos os meus irmãos e amigos da vizinhança. Comecei a me entender como uma criança veada, como me chamavam na época durante os bullyings que eram direcionados a mim. Por conta do que ouvia isso sempre esteve na minha cabeça de uma forma intimidadora que dizia que o meu jeito de ser era razão de vergonha para todos da minha família e que por isso todos iriam me distanciar de suas vidas. Então eu, para sofrer menos, comecei a ficar atento a todas as ações dos meus pais e irmãos. Eu teria que ter uma reação que me fizesse sofrer menos no futuro, caso eu fosse expulso de casa. As formas com as quais eu era agredido através de apelidos e piadinhas me faziam crer que o meu verdadeiro eu era a razão para desgostos da minha família e tantas tristezas que eu viveria no futuro.

Aos 10 anos

             Paralelo a isso, ainda quando criança, por um longo período eu vivia dividido entre o amor eu sentia por minha mãe e o rancor de me sentir deixado de lado ou com menos importância que minha irmã mais nova (mais nova por ser a última irmã do sexo feminino, tá?... pois, ela é mais velha que eu...). Durante muito tempo eu fui o caçula da família e, como todos dizem que o caçula é sempre o mais mimado, eu sentia falta do meu mimo. Era como se estivessem me anulando, tirando meu lugar por direito e dando a outra pessoa. Eu queria me sentir amado, mimado, querido... Todas as férias, por exemplo, minha mãe prometia de me trazer para conhecer São Luís, onde meus irmãos mais velhos já moravam. Quando chegava o período das férias minha irmã adoecia e minha viagem era cancelada para que ela pudesse vir à capital tratar da saúde. Na minha cabeça eu era preterido por minha mãe e minha irmã era a usurpadora do amor que minha mãe teria por mim. Sofri por isso por muito tempo achando que tudo era por vergonha de que as pessoas descobrissem que eu não era "normal". Com o passar dos tempos e alguns outros acontecimentos em nossas vidas, fui crescendo, amadurecendo, fui refletindo e percebendo de fato que não se tratava disso. Era questões de saúde frágil que ela tinha e, por isso, uma questão de prioridade e urgência. Não se tratava de deixar de gostar de uma em detrimento de outro. Mas, ninguém nunca se sentou e conversou sobre isso para que pudesse ter entendido mais cedo e sofrido menos. Não se tinha este tempo. Assim com o passar dos anos eu fui sozinho - e internamente - perdoando as duas e nossas relações foram se aproximando.

Eu e minha irmã Rogenia

                Dito isso, vejo que apesar de que a minha homossexualidade não tenha sido propriamente dita a causa para eu me sentir preterido por minha mãe, eu sei que todos percebiam-me diferente e que tinham medo de como eu seria, qual seria minha postura, como eu levaria minha vida, como eu enfrentaria o mundo. Até então eu era o único gay da família. Era tudo estranho para mim e hoje eu percebo que para meus pais também. Aliás, acho que meu pai foi um dos últimos perceber-me gay, apesar de ter sido um menino afeminado e, por vezes, confundido por menina. Muitas vezes fui impedido de ir a eventos que gostaria de ter ido, de brincar com as brincadeiras que todas as demais crianças brincavam, onde brincavam, com quem brincavam... Com meu amadurecimento, minhas terapias e minhas análises da vida fui percebendo que, para tantas mães e pais que vejo destratando e maltratando seus filhos, eu fui até um sortudo. Pois, sempre fui levado para um caminho que me fizesse continuar estudando, buscar um trabalho para ser visto e respeitado. Percebo que direcionaram a este caminho apesar de entender que o fato de ser gay não era - nem de longe - o que eles queriam para minha vida e para nenhum dos meu irmãos. Nem imaginam eles que, nem eu queria. Optar, escolher nunca foi opção... mas, fazer o quê? É o que temos para hoje, ou melhor, para esta vida. Depois fui descobrindo que um tio de minha mãe – irmão da minha avó materna - era homossexual, ficou cego por causa da diabetes, e morou com minha avó muito tempo, até seu falecimento. 

Eu e minha mãe 

Mais à frente, em um tempo bem recente, fui me perguntando por que minha mãe me tratava diferente de pais intolerantes. Com cuidado e tentando me manter por perto, acho que até pensando que eu nunca sairia de casa. Analisando minha condição afetiva e sexual e minha postura diante da vida me questionava de onde vinha minha determinação para eu ser eu, apesar dos pesares. A resposta estava na história de vida de dona Terezinha, minha mãe. Sua história me mostrou que ela foi determinada e à frente de seu tempo desde sempre. O amor direcionou sua vida, e a de todos nós.  Com apenas 16 anos ela, uma menina branca, aceitou casar-se com meu pai, que era totalmente fora do que seu pais tinham como referência positiva para casar com sua filha mais velha. Raimundinho era um rapaz que trabalhava em uma farmácia na cidade e, pior de tudo, era preto! Ela enfrentou todo o preconceito de seu pai e por isso ele ficou sem falar com ela quase um ano. Depois, meus avós e meu pai se tornaram grandes e queridos amigos, papai foi tomado como padrinho de uma de minhas tias mais novas. Mais à frente os pais sendo católicos – o pai frequentador de festas em terreiros de “terecô”, como ela diz – ela optou por ser evangélica e a exigir respeito por isso quando ele a repreendeu por isso. 


          Eu comecei a ver muito de minha mãe em mim, coisas que vão muito além de nossos corpos acinturados e do quadril largo. Comecei a ter mais orgulho dela e de mim. Tínhamos muito mais em comum... nossa determinação fez eu me enxergar nesse espelho. Tudo isso, fez eu fortalecer ainda mais meu perdão a seu jeito de me criar, como se precisasse. Ela, apesar do pouco estudo e baixo acesso às informações fez seu melhor deixando seu instinto materno, seu senso de justiça e seu amor lhe guiar.


             Cresci em uma casa onde tudo era levado muito sério, mas que sempre tinha tempo para levar a vida com brincadeiras. Papai tinha umas tiradas engraçadas - pelo menos naquela época- com seus amigos mais próximos. Hoje seriam brincadeiras taxadas como  de racismo recreativo e homofóbicas. As relativas ao racismo, sim, hoje são consideradas racistas. Contudo, ele sendo homem preto, brincando com seus amigos pretos, nos soava - e eram - como um grande deboche aos racistas. Do tipo... "sou preto e daí?! Isso não é nenhum peso". E vejam que racismo já lhe tinham criado situações em família. Isso me fez crescer com esse sentimento de desdém aos racistas. Do tipo não me ofender por ser chamado de preto, moreninho, neguinho... até a cidade era formada por pessoas pardas como nós. Nunca tomei isso como ofensa, por mais que essa fosse a intenção. Eu sempre tive muito orgulho da minha cor e origem.  E cada vez tenho mais.

Com meus irmãos mais novos, Otair e Isandro.

         Quanto as brincadeiras homofóbicas eu desde muito cedo entendia como sendo brincadeiras que levavam a uma diminuição da pessoa gay por ser gay. Eram brincadeiras mais pesadas e que me feriam muito. Não me chateavam com papai por isso. Até pelo fato de que ele não dirigia as brincadeiras a minha pessoa. Mas, me machucavam pelo fato de que brincadeiras semelhantes me eram usadas na rua ou na escola para me atingir e me ofender gratuita e brutalmente. Aliás, outras brincadeiras que me feriam com a força de um soco no estômago eram as brincadeiras, xingamentos ou deboches gordofóbicos... sofri muito e muitas vezes com isso. Hoje posso dizer que eu perdoei todos aqueles meninos e meninas das tantas vezes que me feriram e me deixaram cicatrizes gigantes na minha alma e no meu psíquico. E esse perdão vem também pelo fato de que até aquele tempo, eles não tinham as informações dos significados de bullying, racismo, homofobia e gordofobia e todas as bagagens negativas que estas atitudes trazem agregadas. Perdoo-os apesar de saber que o sofrimento de alguém nunca deva ser recreação para ninguém. Agora os tempos são outros e as informações brotam em todo e qualquer lugar. As informações estao ao alcance das mãos de qualquer um. Hoje é mais difícil dissuadirmos nossos corações e nossas mentes de perdoarmos verdadeiramente, em especial quando somos vítimas de algo assim.. nao à toa estou escrevendo este texto em caráter reflexivo.

                Se por um lado eu não tinha rancor do meu pai pelas brincadeiras racistas e homofóbicas de seu repertório. Eu lhe tive muita mágoa entre os meus 15 e 30 anos por conta de ter descoberto, aos 15, que ele tinha um filho mais novo que eu fora do casamento. Ele sim tinha me tirado o posto de SEU caçula (que eu tinha tanto orgulho) e dado a honraria a outro menino. E, para piorar, o pequeno seria a nossa cara... isso me distanciou de meu pai, apesar do amor que nunca acabou. Mesmo sabendo que a criança morava em um povoado vizinho a nossa cidade, nunca fui o conhecer, e quando mudei para São Luís – ainda com 15 anos -, ficou ainda mais cômodo para mim  e meu ciúme rancoroso. Quando papai faleceu eu já tinha 25 ano e apesar de nos falarmos e dizermos um ao outro que nos amávamos eu sempre ainda tinha lá no fundo do coração um rancor não curado. Meus irmãos e minha mãe já o tinham perdoado e foram atrás o meu irmão mais novo. Eu não quis aproximação. Sempre argumentava que se ele não tinha culpa de nada, muito menos tinha eu. Assim seguir até meus 30 anos, quando a vida o fez vir a São Luís resolcer algo e eu, já um pouquinho mais maduro, nos permitir uma aproximação. Isso foi interessante, pois um pouco mais a frente - uns 2 anos depois - descobri um outro irmão, não mais novo, pois este na verdade nasceu entre eu e o caçula de fato. Aí já era tarde... eu já tinha perdoado quase todo mundo e o acolhi com muito amor. Hoje todos vivemos em harmonia.


              Se por um lado não perdoar os outros nos faz mal, apesar de podermos evitar as pessoas, imagine quando o não perdoar é voltado a você próprio, com nosso eu? É muito mais difícil, principalmente quando o mundo externo nos faz acreditar que muitas coisas nós mesmos somos culpados, em especial quando somos abusados sexualmente. Sim, passei por isso e acreditei na minha culpa por muitos anos. Não apenas me julguei, como me condenei internamente por isso. Este dias vazou um vídeo de um pastor falando justamente sobre isso. Para mim foi mais um abuso que eu sofri. Foi como se eu estivesse sendo acusado pelos estupros aos quais sofri. Com o tempo, com as leituras, pesquisas sobre trabalhos de especialistas no assunto e as terapias que faço há anos sei que não tenho culpa. Eu fui colocado nesse local por uma pessoa mais velhas de fato, que se aproveitara. da minha inocência, infantilidade, carência, afetividade e da confiança que a família lhes tinham para cometerem seus atos libidinosos e criminosos. Apesar da violência sexual física ainda houve sobre mim a plantação de culpa na minha (in)consciência pelos abusos que sofri. Tudo isso me causaram muitos transtornos comportamentais, psicológicos e psiquiátricos bem sérios tratados em terapias e com acompanhamento médicos e medicamentosos. Apesar dos meus sorrisos e gargalhadas. Vide este texto...


         Hoje apesar de ter me perdoado por ter me culpado por muito tempo carrego ainda marcas profundas desse filme terrível que vivi sozinho durante a maior parte dos meus quase 45 anos de vida. Tenho consciência plena, plena e plena que não tenho culpa de ser gay – até por isso nunca foi fator de culpa - e menos culpa ainda de ter sido abusado. Já houve quem insinuasse diretamente a mim que o fato de ter me "desenvolvido a homossexualidade" tenha tido relação com o fato de eu ter sido abusado por homens, o que teria me deixado confuso. E não foi isso... eu me percebi com minhas paixões platônicas por amigos dos meus irmãos bem antes do primeiro abuso. Eu achava homens mais bonitos e interessantes que mulheres - e ganhei cascudos por isso - aos 6 anos de idade. Os abusos que recordo começaram aos 8 anos... Não me "tornei gay" por ter sido abusado. Tenho consciência absoluta que só fui abusado por perceberem que em mim uma criança gay e afeminada. Ser assim é involuntário, em especial na infância isso não é opção. Aliás, na fase adulta a única opção que temos é se aceitar e se assumir.


              Este dias pensado sobre o tal perdão, vi um vídeo no Instagram de um padre dizendo que o perdoar não é sobre o outro, o culpado... é sobre nós mesmo. É um benefício que damos à nós mesmos. É sobre a nossa própria libertação do peso de tá "amarrado" a quem nos ofendeu, machucou ou feriu. O ato de não perdoar é, segundo demonstração do padre, como se nós andássemos - para cima e para baixo - sempre de braços dados àqueles que nos causaram os males até então imperdoáveis. Didaticamente vemos no vídeo que o fantasma dos nossos algozes fica conosco para onde vamos. Enquanto não perdoamos eles seguem nos causando tantos outros males e tirando nossa paz. 


            Analisando e organizando meus pensamentos enquanto faço este texto concordo sim que o perdoar nos tira os pesos das costas e as amarras dos pés. Nos dar mais liberdade e mais paz de espíritos. Isso é fato! Mas, me pergunto: quando entendemos que os males causados são grandes e graves o suficiente ter nos causados feridas à vida toda? Que tais males causaram danos que nos expuseram a outros riscos sérios... é possível perdoar? Como perdoar? 


         Pondo na balança eu perdoei todos os que eu julgava e condenava como se não me quesessem bem. Até o sentimento ruim estava em mim. Estes eu acabei entendendo seus contextos e suas intenções. Acho que tudo passa pela intenção. Tenho segurança de que eles não me quiseram causar mal algum. Não foi intencional e muito menos pessoal. Por outro lado, vejo que é preciso ter mais segurança, mais maturidade e mais força para vermos o momento que podemos dar o indulto do perdão aqueles que só pensaram em si, nas suas satisfações pessoais, que não pensam nas consequências graves de suas violências disfarçadas de carinho e de suas palavras ditas de forma a induzir culpas e ameaças veladas. De fato não sei... não sei se é possível perdoar, e tampouco sei se posso e nem se quero dar este perdão. Já me tiraram tanta coisa... dar esse perdão seria para mim como se eu mesmo estivesse traindo os meus eus crianças de 08, 09, 10, 11, 12, 13, 14 e 15 anos. Ainda sinto como se meu eu adulto estivesse sendo conivente e passando pano com tudo que esses meus eus passaram e trouxeram como bagagem pesada até agora.

Aos 44 anos

            Vou trabalhando a minha mente e o meu coração para perdoar, ou pelo menos superar, os pequenos atos que, porventura, forem acontecendo em meu caminho. Sigo esperando não demorar muito seguindo a vida levando comigo os fantasmas dos meus abusadores. Não obstante espero mais ainda que nenhuma criança ou adolescente tenham sido ou não venham ser  vítimas destes - e de nenhum outro - abusadores. 


                 Por enquanto, por todo esse tempo culpando quem não me quis fazer mal e, principalmente, por me culpar por situações que trago marcas sérias, profundas e ainda doídas eu já tenho a minha compreensão, meu acolhimento e meu perdão. 


                Nos perdoar já é um grande passo... vejamos quais serão os próximos passos. Enquanto isso, vamos de mais terapia. Que veja a próxima segunda-feira.

domingo, 12 de maio de 2024

O MELHOR SORRISO DO MUNDO

 Quando eu nasci, em 1979  ela tinha apenas 35 anos e já tinha tido 9 filhos e ajudado na criação de 01 irmã e 07 sobrinhos do meu pai. E isso eu só me refiro aos que moraram na casa dela depois de casada. Não me refiro aos tempos em que, ainda menor de idade, ajudava a própria mãe na roça para criação dos irmãos.


Ao longo da minha vida sempre houve presença de alguém na nossa casa. Sobrinhos e/ou filhos de amigos que confiavam no seu método de criação. E a todos ela tratava como se fossem seus. Brincava e ralhava igualmente com quem precisasse, pois mãe educa e ensina quando no momento certo.


Não teve tempo de sonhar com a maternidade. Ela cresceu mãe. Ela sempre foi mãe. Dos seus e dos outros.  Talvez por conta disso não tivesse tanto tempo para sorrir.

Suas responsabilidades sempre foram grandes. Não era apenas puramente criar por criar... não era apenas dar comida a tanta gente. Para isso acordava as 5h da madrugada, para preparar café, organizar a produção na padaria, arrumação da farmácia, preparar o café, por o leite pra ferver, separar leite para quem comprava, por alguém para fazer as entregas, por meninos e meninas para se arrumar pra escola, não sem antes ensinar a arrumar a cama ou enrolar a rede... distribuir as tarefas da casa entre escolher quem iria limpar móveis, quem iria varrer, quem passaria pano na casa e quem passaria óleo de peroba nas folhas das plantas da sala (não julguem... era moda da época).... enquanto isso chamava os livres das atividades para pegar 2 galinhas das criadas no quintal para fazer o almoço já feito jantarado.

A tarde uma soneca pra descansar - enquanto eu esfarofava seu cabelo cacheado a la Maria Betânia - e depois a limpeza do quintal, descascar coco para nós e preparação para esquentar o jantar e por os "bunitos" que estudavam no turno nortuno. Já à noite, um pouco de conversa na calçada, onde às vezes - qdo o caminhão que vendia laranja passava -, ela já sentava com uma bacia no colo para descascar laranja para nós que vibrávamos com isso. E quando papai chegava de alguma viagem com uma tarrafinha com maçã??? Uma festa rara àquela época, ela dividia todas em partes iguais. Fosse uma!!! Ela dividia igualmente a todos os presentes. Fossem 8!!! Todos provaram igualmente.


Quando os filhos já estavam em São Luís estudando as preocupações com a segurança, com o estudo, alimentação e as confusões dentro de uma casa cheia de adolescentes na busca de futuro melhor.

Para ajudar nas despesas extras que os que moravam na capital sempre tinham  ela vendia leite (de litro em litro), aproveitava os 20 coqueiros do quintal e vendia coco seco a quem procurava e coco verde quando apareceram caminhões comprando e nos incentiva-nos a vender vidrinhos de injeções aos parques que apareciam pela região (eles usavam na barraca de tiro ao alvo).

Ela não tinha muito tempo para sorrir. Suas preocupações eram sempre grandes. Hoje, certa que fez o seu melhor - sem ter a noção que fez muito além do que poderia - ela consegue rir, sorrir  gargalhar e até chorar de tanto sorrir. Ela tem a segurança que entregou ao mundo pessoas honestas, sérias, batalhadoras, justas, solidárias e de coração que são morada de um Deus Soberano, apesar de nem todos terem a sua mesma religião.


Ela que já foi Terezinha de Jesus Albuquerque de Almeida, passou a ser Terezinha Almeida dos Santos, virou Terezinha do Juruca, Dona Terezinha, Terezinha, Teca, se transformou em mãe - nossa Terólas, Terolás - e foi alçada a Vovó.. e vó é mãe duas vezes. É nossa força inspiradora, nosso centro e, nos dias que as marcas e consequências da idade manda sinal, tudo vira nossa criptonita.

Hoje, como os filhos bem encaminhados na sequência de tudo que ela nos ensinou, nossa maior missão é fazê-la sorrir. O sorriso de Terezinha é o maior abraço que nossas almas e nossos corações poderiam desejar e realizar.

Minha mãe é a melhor mãe que Deua poderia ter nos dado. Ele acertou mais uma vez em cheio!! E, se em outras vidas que Deus tenha nos reservado no futuro nós pudéssemos escolher, escolheríamos tê-la como mãe novamente, sempre!!! Só com uma pedido especial, que ela sempre tenha mais tempo para sorrir e ser feliz.










sábado, 4 de maio de 2024

BELEZA ALÉM DA ESTÉTICA

O Miss Maranhão Gay Oficial nos passos do certame nacional.


Passado uma semana do evento Miss Maranhão Gay 2024 preciso falar do que vivenciamos aquela semana e do que significa eventos como esse.

As finalistas do Miss Maranhão Gay 2024.

 melhor forma que era possível. O evento sempre foi palco para o brilho de grandes artistas que vislumbraram a faixa de Miss Maranhão Gay. Nos últimos 12 anos  aproximadamente,  o certame ganhou o  reforço do multiprofissional - empresário, matemático, bacharel em direito e carnavalesco - Itamilson Lima e leva a maravilhosa Bia Maranhão e depois convida Enoque Silva e a mim para compor sua equipe. Com Itamilson e sua equipe a história de resistência que vinha sendo construída pelo Wallen foi reforçada e foi possível, gradativamente, trazer a festa dos excluídos redutos gays para os salões da avenida que corta as áreas tidas como mais nobres da cidade, a Avenida dos Holandeses. Isso ajudou em uma quebra de paradigma atraindo novos olhares e públicos diverso, inclusive de fora do nosso meio. Com sua perspicácia, dedicação, bom gosto e refinamento Itamilson foi escolhido para coordenar as escolhas das representantes do Maranhão nas franquias nacionais Miss Brasil Gay Oficial - através de votos dos jurados do evento Miss Maranhão Gay Oficial - e Miss Brasil Gay versão Bahia, através de aclamação de uma artista com grande potencial.

Rivanio Almeida, Enoque Silva, André Pavan, Murillo Lorensoni e Itamilson Lima.

Nesse contexto de mudanças de Miss Maranhão Gay para Miss Maranhão Gay Oficial (observe o importante acréscimo do termo "Oficial") a ideia passou a ser caminhar junto com o regulamento do Miss Brasil Oficial, que é a grande referência nacional e que tem uma grande responsabilidade diante da nossa bandeira de combate aos preconceitos contra a coletividade LGBTQIAPN+. Vale ressaltar que, devido as barreiras dos preconceitos que enfrentam diariamente, em muitos casos estes momentos são os únicos momentos para os jovens artistas desfrutarem das experiências de exercício de autocuidado, autoestima e realização de sonhos.  Além do cultivo da esperançade dias melhores.

Adentrando nesta conjuntura, assim como no Miss Brasil de mulheres,  o Miss Brasil Gay Oficial tem mudado e ido mais a fundo nas questões intelectuais deixando a dita superficialidade do uso exclusivo da beleza física para eleger uma representante de toda uma comunidade.  Aliás, quem vive sabe que para se manter em algum lugar, nem falo ter destaque,  nossa comunidade precisa ir mais além nas entregas que os heterossexuais. E, com raríssimas exceções, sempre estamos a frente mesmo. Nossa inteligência, capacidade e competência - e utilidade - são nossas chaves para, se não vencer, pelo menos driblar o preconceito. Pois bem... assim como o certame nacional oficial o evento maranhense passa a oficializar o hasteamento da bandeira de "Beleza com Conteúdo" como requisito para ser Miss.

Muriel Lorensoni, Miss Brasil Gay Oficial 2024

Contrariando algumas mentes negativas esse critério de escolha não veio para inibir a participação de Candidatas ao concurso. Muito pelo contrário... foi acrescentado para estimular aos artistas transformistas que continuem ou voltem aos estudos. É de conhecimento público que gays quando não acolhidos pelas famílias são expulsos de casa e, uma vez na rua, sua prioridade passa a ser a sobrevivência. O abandono escolar é uma das primeiras ações. Quebrar esta corrente se faz necessário, precisamos estimular cada componente da comunidade mudar a própria realidade através do estudo, da capacitação, da educação. A nível nacional as Misses nunca fizeram feio, todas são grandes nomes de artistas, personalidades, profissionais e sabem se comunicar de forma sublime. São todas grandes representantes, dentre outras, Lizandra Brunelli, Antônia Gutierrez, Michelle X, Sheila Veríssimo, Marília Córdova. Seguindo o fluxo da história e das mudanças, em 2023 o Miss Brasil Gay Oficial elegeu Muriel Lorensoni, que é DOUTORA em Estudos de Cultura Contemporânea pela Universidade Federal de Mato Grosso. Isso não é pouco!! Isso tem um peso enorme no item representatividade! A busca por desenvolvimento intelectual das artistas através da educação precisa ser estimulado e copiado, muito embora saibamos que a nível acadêmico os casos como de Muriel são exceções no Brasil todo. Esse é um momento em que o concurso de beleza mais importante à comunidade LGBTQIAPN+ estimula a resistência atraves do empoderamento de nossa gente.

Gisele Garcia, Miss São Luís Oficial desfilando traje de gala no Miss Brasil Oficial 2023.

Gisele Garcia, Miss São Luís Oficial desfilando traje típico no Miss Brasil Oficial 2023.

Fazendo uma retrospectiva as Misses Maranheses Gays, guardadas as devidas proporções, não tem feito feio nesse item, embora tenhamos a consciência que podemos melhorar muito mais esse cenário.  E, por isso, não se pode parar, muito pelo contrário, é preciso continuar e estimular ainda mais o desenvolvimento dos artistas para serem eles mesmo, e suas personagens, fortes Candidatas diante das demais 26 concorrentes. A nivel estadual tivemos como Misses nomes que tem se tornado grandes referências profissionais.  Nomes como Marília Córdova (estilista e costureira), Valeska Furtado (influencer, humorista, apresentadora de TV e rádio), Dominica (apresentadora de TV), Lunna Mitchel (cabeleireira e maquiadora), Jade Hwskaier (estilista e costureira), Bia Maranhão (Cabeleireira e empresária) e Surama Wilker (cabeleireira e maquiadora)... e tantas outras representantes. Vale inclusive lembrar que, apesar de então representante do Ceará, a maranhense Marília Lutia (hoje Cordova) foi eleita Miss Brasil Gay Oficial 1990. Ressalto que, nos últimos anos, o nome do Maranhão têm conseguido grande visibilidade através de misses como Jade Hwskaier que em 2022 ficou no top 6, Lunna Mitchel maranhanse que representando o Piauí em 2023 ficou no Top 3, Gisele Garcia - Miss São Luís 2023 que representou o Maranhão pela impossibilidade da Miss eleita poder fazê-lo por infringir um dos regulamentos nacionais, pois ela já tinha um título Miss Brasil Gay (das América ) - ficou em 11⁰ lugar sendo muito elogiada e procurada por outros coordenadores de Estados. Além disso, a cearense Monick Skaranze, representando o Maranhão, venceu o Miss Brasil Gay versão Bahia e Ariely Duailibe, Miss Maranhão Trans, venceu o Miss Brasil Trans 2023. É o Maranhão dando nome e sobrenome na arte do transformismo brasileiro.

Raielly Campos, Miss Maranhão Gay Oficial 2024.

Sábado passado, apesar da forte chuva que atrapalhou o deslocamento das pessoas, e com as presenças ilustres de André Pavan (Diretor Artístico do Miss Brasil Gay Oficial), Muriel Lorensoni, Antônia Gutierez, LizandraBrunelli (detentoras do título Miss Brasil Oficial 2023, 2019 e 2008, respectivamente), Monick Skaranze (Miss Brasil Gay versão Bahia 2023) e Ariely Duailibe (Miss Brasil Trans 2023) foi realizado no Basa Clube, no Calhau, o concurso que - analisando beleza, passarela e oratória -, escolheu a mais preparada da noite para levar a faixa do Maranhão para Juiz de Fora - MG. Foi eleita a Miss Maranhão Gay Oficial 2024 a representante de Timon, Raielly Campos. Em 2⁰ lugar, ficando com o título de Miss São Luís, Scarleth Souza, representante do município de Barreirinhas. No mesmo evento Kyara Gomes foi aclamada para a faixa Miss Maranhão Gay versão Bahia 2024 e irá concorrer ao certame de Salvador.

Se nossas Misses vão trazer as faixas e as coroas ainda não sabemos, uma vez que em ambos os concursos nacionais a concorrência é muito forte e a dimensão dos eventos é enorme - em Salvador acontece em um grande teatro e em Juiz de Fora esse voltará a ser realizado em um ginásio com capacidade para quase 5 mil pessoas, o que deixa tudo muito maior e até intimidador para quem vai participar -. Em todo caso, e independente dos resultados, temos a consciência da nossa responsabilidade como componente da equipe de produção do evento local e da produção das nossas Misses para fazerem tudo lindo e perfeito nos eventos nacionais. Além disso, temos a certeza que, no que depender da gente, da produção, o nível dos trabalhos apresentados pelo nosso Maranhão não vai cair. Aliás a ideia é subir. Sempre!

Que nossas estrelas, tanto em Minas quanto na Bahia, brilhem muito! 

quinta-feira, 25 de abril de 2024

MISS MARANHÃO GAY SERÁ REALIZADO NESTE SÁBADO EM SÃO LUÍS

 A arco-íris produções realiza o evento que escolherá a representante maranhense no Miss Brasil Gay 2024

 

Top 3 do Miss Maranhão Gay 2016.

No dia 27 de abril, às 21h, no Clube do BASA, acontecerá o concurso que elegerá a @miss.maranhao.gay.oficial 2024.

Os ingressos estão à venda na Bilheteria Digital. No dia do evento estarão disponíveis também na bilheteria do local a partir das 19h. A festa será transmitida para todo Brasil pelo seu canal no youtube http://www.youtube.com/@miss.maranhao.gay.oficial

Na programação, além do desfile haverá várias apresentações de transformistas performáticos vindo de várias partes do Brasil.

Surama Wilker e Bia Maranhão, 1997.

Participação especial da atual Miss Brasil Gay, Muriel Lorensoni, eleita em 2023, na cidade de Juiz de Fora. Um transformista paranaense, doutor em Estudos de Cultura Contemporânea pela Universidade Federal de Mato Grosso, que tem viajado o Brasil inteiro usando esse lugar de fala para levar uma mensagem transformadora e estimulante à comunidade LGBTQIAPN+ historicamente excluída e segregada no Brasil.

Muriel Lorensoni,  Miss Brasil Gay 2023.

Presentes também a maranhense Ariely Duailibe, atual miss Brasil Trans, eleita em novembro de 2023, na cidade de São Paulo representando o Maranhão e Monique Skaranze atual Miss Brasil Gay Versão Bahia, cearense que também venceu a edição nacional representando o Maranhão em Salvador, em novembro de 2023.

Destaque ainda para os artistas performáticos do eixo Rio/São Paulo, Alexandre Hakan, Marcinha do Corinto e Lizandra Brunelli e dos artistas locais Bia Maranhão, Surama Wilker, Suzane D’Castro, Luana Phaifer, Lunna Mitchel, Valeska Furtado, Yanna Biankini e Dalma Calado.

Alexandre Hakan

Abrilhanta a festa ainda, a pernambucana Antonia Gutierez, ex Miss Brasil Gay de 2019 e André Pavan, diretor artístico e coordenador nacional do Miss Brasil Gay Oficial.

A festa tem o patrocínio da Prefeitura Municipal do São Luís, por meio da SECULT e o apoio cultural do vereador Astro de Ogum, parlamentar de São Luís que há mais de 20 anos apoia e incentiva este evento, que é uma das maiores festas da comunidade LGBTQIAPN+ do estado.

O Miss Maranhão Gay, concurso realizado há 44 anos, se transformou em um dos maiores eventos de beleza do Maranhão. Ao longo desses anos resistiu e enfrentou muitas dificuldades e truculências. Suas primeiras edições, na época da ditadura militar, foram feitas em sítios particulares, na região da ponta d’areia, somente para convidados. Após a redemocratização, em 1985, a festa ganhou feições públicas, porém realizada nos guetos. Somente em 2014, há exatos 10 anos, quando passou a ser feita na Panetti Bufett, a festa chega às melhores casas de eventos da cidade, se tornando um dos maiores espetáculos locais de arte e beleza transformista.

 

Coordenação: Itamilson Lima e Wallen de Sousa

Organização: Itamilson Lima, Enoque Silva, Rivanio Almeida e Bia Maranhão

domingo, 31 de março de 2024

AS PÁSCOAS MAIS FELIZES NÃO TINHAM OVOS DE CHOCOLATE

 

Padre Diniz na procissão de Páscoa da Comunidade Católica de Santa Teresa do Paruá.

O período Pascal cada dia mais está sendo imortalizado pelos comerciais ovos de  chocolate, ovos de colher, caixas de bombons (cada vez mais vazias) e barras (cada vez menores)... e dá-lhe Garoto, Lacta, Nestlé, Cacau Show, Ferrero Rocher, Kopenhagen... têm sido Páscoas gostosas, mas vazias de significados. Têm valido mais os valores monetário dos ovos que os valores de Cristo.


Eu não sou tão velho assim... (pelo menos ainda), mas, estou caminhando pra lá e ficando sempre mais reflexivo quanto ao ser humano que venho me tornando. E, por esta razão, quando chega estes períodos eu me questiono o motivo de tanta gente tá vivendo distanciamento do sentido real dos designos Divinos e pouca gente, assim como eu seguir sempre buscando o lado do amor, do bem, da solidariedade, da compaixão, da partilha, dos necessitados, dos excluídos, da união... do sentido de renascimento que a vida de Cristo tenta nos ensinar ainda nos dias de hoje?

Bom, apesar de ter nascido em uma família (Assembleia de Deus) eu estudei em uma escola que foi fundada por um Padre Camboniano, o sempre admirado Pe. Diniz, por quem teremos uma eterna gratidão, que teve a sua frente Professora Eliane, Professor Aécio e que mais tarde fora dirigida pelos Irmãos Lassalistas. Embora muito ligada a igreja católica o Colégio Santa Teresa nunca foi excludente, muito, mas, muuuuuuito pelo contrário mesmo. Desde sua  fundação e construção sempre teve a participação e contribuição de todos da comunidade, independente da religião que seguisse. Isso por si só já é um grande ensino de união.

Nas aulas tínhamos todas as atividades muito ecléticas e com a participação de todos. Ali tudo era baseado nos verdadeiros sentidos cristãos. No período Pascal, por exemplo, tínhamos sempre as leituras diárias das passagens bíblicas que eram importantes para entendimento da vida de Cristos e as razões que o levaram a viver e dar sua vida por nós. E na Semana  tínhamos as dramatizações e a celebração da Santa Ceia, onde cada um ficava responsável por levar alguma coisa para preparar a sala para nossa cerimônia do lava-pés. Bacia, toalha de mesa, toalha para secar pés, pães, peixes fritos ou assados, suco de uva (ou vinho, dependendo da série), cada um escolhia o que poderia levar, se pudesse levar. Era lindo de ver e, principalmente, de viver tudo aquilo. Era como se Jesus estivesse presente... e os professores eram os intermediários desse processo de visualização e sentimento do Divino (Salve Mariazinha, Diquinha, Eunice, Brígida, Izabel, Carlos, Ir. Odyllo, Ir. Dionísio, Ir. Renato e tantos outros... e os cânticos? Nossa! Estes foram a trilha sonora das nossas vidas e deixavam tudo mais emocionante:

"E quando amanhecer
O dia eterno, a plena visão,
Ressurgiremos por crer
Nesta Vida escondida no pão"
(Antes da Morte)

"Deus está aqui
Tão certo como o ar que eu respiro
Tão certo como o amanhã que se levantará
Tão certo como eu te falo e podes me ouvir"
(Deus está aqui)

"O senhor é santo
Ele esta aqui
O senhor é santo
Eu posso sentir
Quando olhei o sol brilhar, vi que o senhor é santo
Vendo as estrelas do céu, vi que o senhor é santo
Na imensidão do mar, vi que o senhor é santo
No orvalho da manhã, vi que o senhor é santo"
(O Senhor é Santo)

"Também sou Teu povo, Senhor
E estou nessa estrada
Cada dia mais perto da terra esperada!
Também sou Teu povo, Senhor
E estou nessa estrada"
(O povo de Deus)

"Me chamaste para caminhar na vida contigo
Decidi para sempre seguir-Te, não voltar atrás
Me puseste uma brasa no peito e uma flecha na alma
É difícil, agora, viver sem lembrar-me de Ti"
(Te amarei Senhor)

"E Seu nome era Jesus de Nazaré
Sua fama se espalhou e todos vinham ver
O fenômeno do Jovem Pregador
Que tinha tanto amor!"
(Um Certo Galileu)

Fachada da minha casa, de onde minha família acompanhava a passagem das procissões de Páscoa.


Por falar em música, uma coisa que eu sempre achei o ápice de tudo era a procissão que a igreja católica fazia da entrada da cidade até a frente do Salão Paroquial no Centro Comunitário e depois, com a construção da igreja de Santa Terezinha do Menino Jesus,  até a frente da mesma. A frente das pessoas vinham uns fiéis representando Cristo carregando a Cruz recebendo chicotada dos guardas romanos e quanto Maria acompanhava a paixão de Seu Filho. Atrás deles vinham o padre e as pessoas caminhando devagar, lendo trechos da Bíblia e cantando os cânticos mais lindos e emocionantes que já vi na vida. Para ajudar no alcance da escuta das leituras e acompanharem os cânticos o padre e as pessoas que puxam os textos e a cantoria usam microfones sem fios que eram replicados em radios-gravadores sintonizados na mesma frequência dos microfones.  Nem preciso fechar os olhos... de olhos abertos consigo visualizar perfeitamente o Ir. Dionísio Bruxel segurando um desses rádios-gravadores na altura de seu ombro (ele era um dos mais altas das cidade). Eu não acompanhava a procissão, mas todas as vezes ficava sentado no muro do terraço lá de casa com toda atenção e respeito para ver aquela movimentação que simbolizava pra mim nosso amor ao Pai Celestial.

Esse período sempre foi sinônimo de muita fartura e união  embora nunca tenhamos tido nenhuma graaaande desavença com nossos conterrâneos (salvo as contendas de crianças). Contudo, parece que a chegada da Semana Santa esse sentimento era ainda mais forte e mais lindo - sempre gostei mais que do Natal - pois era o período que a cidade ficava ainda mais cheias dos nossos irmãos  e amigos que moravam fora da nossa Santa Teresa do Paruá. Ali perto de casa iam de São Luís sempre algum dos meus irmãos, D. Fracisquinha e Santídio (mãe e sobrinho do Soares, que moravam em Belém), D. Maria e seu filho Antônio (de Governador Acher, mae e irmão do Osmar Dentista), a Pretinha/Eletilce de D. Adelina (que na época, me parece, morava em Bacabal), Ana do Seu Sebastião Falafina com sua prole (eles moram ainda em Brasília). Na cidade se juntavam à Netinha Soares, Nete do Osmar, Francisca Sales, Maria do Newton, Delina, Lauriza, algumas filhas de Maria do Santinho e era uma produção enorme de canjica, minguau, pamonhas e bolos de milho verde, de tapioca fina, tapioca em caroço e macaxeira... cada uma faziam os seus e depois trocavam pedaços para provarem uma das outras. Era um festival gastronômico e de partilha incrivelmente delicioso de vivenciar. Era muito pouco ver e é pouco ouvir ou ler sobre... bom mesmo foi viver tudo isso de dentro do que se passava. E nós, então crianças, vivíamos em cambada atentando (leia-se brincando e  brigando) juntos, mas nunca nos largávamos.

Maria e Eletilce na produção se bolos da Semana Santa.


Naquela época a semana toda era Santa, digo... feriado...rsrsrs... então dava tempo de vivermos tudo isso e ainda tínhamos tempo de irmos ao terreno da família do Soares na estrada do Centro do Guilherme banhar de açude, ir a nossa chácara na Cabeça da Égua (bairro) assar castanhas e ainda visitar Dona Deuzuíta e Seu Joaquim no Engenho, depois do bairro do Mutirão, onde ela moravam com seus filhos e produziam cana-de-açucar e cachaça da terra (lá tinha um açude maravilhoso... água pra lá de gelada).

Engana-se quem pensa que estou falando de comidas pascais... estou falando das relações cristãs, das relações fraternas, das relações humanas,  pois, sendo cristãos os ensinamentos de Jesus Cristos nunca passou por qualquer sentimento ou prática de exclusão por qualquer que fosse os motivos, nem mesmo por crenças distintas - Isso aprendi graças aos ensinamentos da Palavra Divina passadas por meus professores e pela práticado meu pai Raimundo Juruca. Assim eu sigo tentando viver... e trago essa prática desse período, de onde vêm minhas maiores lembranças, aliás, mais que isso!!! Minhas maiores referências de acolhimento e doação para ajudar o próximo. E eu tenho muito orgulho dessa minha origem.

domingo, 4 de fevereiro de 2024

LOUCAS MEMÓRIAS

 Toda cidade tem seus moradores que entram para a história como personalidades ilustres, que ficam na memória das pessoas por anos a fio.  Em Santa Teresa do Paruá, minha terrinha Natal (a 416,1 km de São Luís via BR315 e a 251,7 km via ferry-bout) não é diferente. Tem muita gente querida por ter contribuido significativamente com a construção socioeconômica da cidade, mas há ainda os que contribuíram, mesmo que involuntariamente, com a construção de uma história à parte ligada, digamos, mais ao imaginário popular e que não merecem ser esquecidas.

Vista aérea de Santa Teresa do Paruá 

Muito bom ter nascido e ter podido crescer na minha cidade em um período importante para sua consolidação como uma comunidade unida, com necessidades, sonhos e lutas comuns.  E ao longo do tempo de ter acompanhado seu crescimento e emancipação de fato. Saindo da condição de município de Turiaçu para ser município de Santa Luzia do Paruá e, por fim, virá cidade sede. Pena que com nome de Presidente Médici, um dos piores ditadores da história brasileira. Mas, enfim... voltemos ao foco.

Bom, são muitos os nomes de pessoas que ajudaram a por cada tijolinho de nossa história. Muitos ainda estão vivos acompanhando a história continuar a ser escrita. Alguns já partiram desse mundo e deixaram suas contribuições e exemplos de trabalho, honestidade e amizade. Esses ficam na história documentada em pesquisas escolares, em nomes de prédios públicos, podem virar nomes de ruas, avenidas... e seguirão sendo história passada de geração em geração.

Contudo, em toda e qualquer localidade sempre existem alguns que suas histórias vão sendo passada de boca a boca como sendo personagens de contos e causos. Esses passaram suas vidas às margens, sob os estigmas preconceituosos de loucos, estranhos... mas, alguns era apenas diferentes e excêntricos ou exóticos. Eram assim considerados por terem alguma deficiência mental, intelectual ou física e tão tinham os devidos tratamentos necessários e aos quais temos conhecimento com maior facilidade - ou com menor dificuldade - atualmente. Santa Teresa, apesar de, na época que eu morava por la - década de 1980 e 1990 - ser um lugar relativamente pequeno teve um razoável número de pessoas que tinham características mentais diferenciadas dos "ditos normais" (eu até hoje sigo querendo saber o que é normal...)

Quando eu era pequeno meu avô paterno, Seu João Batista Cantanhede - João Juruca, daí o apelido de meu pai - morava, se não olhei errado no Google Maps, na Rua São Benedito. Vizinho a ele, quase em frente a sua casa, morava um garoto  fogoió com idade semelhante à minha. ARMINDO cresceu andando a cidade e tinha alguns comportamentos característicos recorrentes como balançar os braços em círculos, saltar sorrindo e batendo as palmas das mãos... Ele, volta e meia, soltava uns palavrões cabeludos - kkkkkkkk - para desespero dos adultos. Em compensação sabia de cor e salteado o roteiro de uma missa. Muitas vezes ele ia lá pra casa e ficava na farmácia conversando com a gente, que sempre pedia que "rezasse" a missa. Ele fazia sem reclamar. Eu achava incrível sua capacidade de memorização.

Outro que sempre ia la em casa, normalmente aos fins de tarde, e ficava olhando papai tirando a barba - ele fazia isso sentado em um tamborete na calçada da farmácia - era um rapaz conhecido como TI CACHORRÃO. Sempre com uma Correia na mão, andava a cidade girando sua Correia. Apesar de estar sempre "armado" com sua peça ele era uma pessoa pacífica. Cumprimentando a todos com seu conhecido "Ei, ti!".

Recordo ainda de uma mulher magra,  alta, que tinha um filha - não recordo o nome - e estava quase sempre estava alcoolizada. Seu nome era Maria Joana e tinha o apelido de MERENGUE. Era comum ela andando a cidade já embriagada, cantando, dançando, com uma garrafa em uma das mãos enquanto com a outra arrastava a filha. Não recordo a última vez que a vi e qual seu fim e nem de sua filha.

Tenho também uma breve recordação de uma espécie de "VELHO DO SACO". E, apesar de conseguir visualizá-lo mentalmente, não recordo seu nome. O fato é que ele andava vestido de roupas rasgadas e sujas, com um saco pendurado em um pedaço de pau aos quais ele arregava nos ombros. E, como criança não é cria de gente, os meninos gritavam um apelido a ele, que corria com raiva atrás dos pestinhas.

Não sei hoje, entretanto quem conheceu o centro Comunitário da Comunidade Católica de Santa Teresa conheceu e admirou as pinturas da capela (não recordo qual) e do refeitório (a Santa Ceia do Senhor). Ambas feitas com muita perfeição e afinco por um artista chamado ADOLFO. Recordo ligeiramente dele, um homem negro, tinha uma conversa articulada, fundamentada e bom vocabulário. Contudo era visível que não gozava de boas faculdades mentais. Todos falavam que ele ficou daquele jeito de tanto estudar... isso passou a ser argumentação para alguns preguiçosos para estas atividade - eu mesmo, quando adolescente, argumentei várias vezes. Não adiantava... tinha que estudar, ainda bem.

Eu sempre tive uma relativa boa convivência com todos estas pessoas. Pois, eram todos calmos. Então eu não tinha medo de quase nenhum deles, pois não imprimiam nenhum tipo de agressividade. Contudo... meu Deus!!! Teve uma senhora que me apavorava, a MULHER DO ÍNDIO. Uma senhora baixinha, que morava lá pras bandas do bairro das Três Barracas. Quando estava bem nunca a viamos circulando pela cidade. Ao passo que todas as vezes que tinha crises saía andando apressadamente pela cidade e, como que lei, sempre tinha que passar lá em casa, pois sempre ia a procura do meu pai. Quando ele estava em casa, tudo bem. Mas, quando eu estava sozinho tomando conta da farmácia ficava sempre apreensivo com medo dela aparecer. E quando aconteceia dela despontar na rua e alguém me avisasse, eu baixava as portas da drogaria e corria para fechar porta e janela da casa também. Certa vez ela entrou procurando papai antes que eu chegasse a tempo de fechar.  Na volta entrou no quarto dos meninos, que antecedia a porta do ambulatório, e deu de cara com um desenho gigante do Rambo segurando uma metralhadora. Ela saiu correndo e gritando pedindo para o "soldado" não atirar nela. Eu sempre rir, de nervoso, dessa história. A Mulher do Índio tinha uma fixação pela figura do meu pai,  que sempre lhe atendia bem. Certa vez a mãe dos meus sobrinhos Lucas e Teresa, que é jornalista, foi fazer uma matéria na clínica que acolhia pessoas em crise e a conheceu. Quando conversaram e descobriram o ponto em comum, seu Raimundo Juruca, a interna cismou que a então repórter, Cristiane Moraes, tinha que levá-la dali. Foi sufoco pra equipe de reportagem sair da clínica.

Uma outra pessoa que frequentava muito nossa casa era chamado de MANÉ PRETO. Conheci esse ainda pequeno.  Menino negro e gordinho de nome Antônio que foi criado pelo Seu Sabino, um curandeiro que foi muito amigo do meu pai. Moravam nas primeiras casas do bairro Cabeça da Égua, no sentido de que ia para o outeiro. Toda vez que eles vinham pra as ruas da cidade, encostavam lá em casa. Quando o velho Sabino faleceu, papai ficou responsável, por comprar uma casa para que o Antônio morasse mais próximo a cidade, já que não tinha nenhum outro parente.

Uma pessoa, ou melhor, uma família que não era de lá, porém sempre passava pequenas temporadas na cidade era uma  dona de um pequeno circo. A família era formada pela Mãe, a filha e o Pai, conhecido como MENINO DE OURO. Recordo bem que eles eram negros e tinham os cabelos pintados de dourados. Eles não eram, até que se prove o contrário, pessoas com algum tipo de deficiência intelectual, mas tinham uma vida nômande  muito diferente da vidas de nós que tínhamos residência fixa. Isso despertava curiosidades.

Nesse contexto, de não ser deficiente de cognição, mas de serem pessoas autênticas, marcantes e, por isso, foram do comum tivemos outros amigos. Esse é o caso da dupla VERDIANO e BRABO. Eles eram dois amigos e vizinhos que ganhavam a vida sendo coveiros e fazendo bicos nas casas da cidade como cavando ou lavando poços, capinando ou limpando quintais. Outra prática que os dois tinham em comum era o gosto pela pinga. Não difícil eles passavam pelas ruas após algum trabalho e após tomarem suas merecidas doses de alguma branquinha.

Morando em uma casa quase de fundo com nosso quintal tinha a MARIA GARIMPEIRA. Uma mulher que sempre achei interessante. Trabalhou  garimpos durante uma parte de sua vida e fixou residência em Santa Teresa. Não tinha muitas posses, só que isso não era desculpa para que não andasse sempre arrumada, perfumada, cheia de Colares, pulseiras, anéis, maquiada, cabelos pintados e penteados. Sua vaidade era muito admirável.

Outra mulher muito vaidosa e curiosa era DONA FRANCISCA, esposa do Seu Cabeça Branca, um comerciante que tinha na Praça das Quatro Bocas - acho que depois deles quem morou no endereço foi o Mauro Jacu. Dona Francisca tinha um cachorro chamado Benjamin com o qual passeava pela cidade e tinha muito carinho. Ela tinha como dote artístico a dança. Vez por outra coloca a vitrola na calçada de casa com músicas altas e se punha a dançar diante de uma plateia que se formava curiosa.

Joyce Morais

A outra mulher - esta trans -  marcante foi minha querida amiga JOYCE, a pioneira da cidade. Conheci ela ainda pequena, antes de se assumir esta personalidade, com nome e pronomes femininos. Desde criança andava sempre na ponta do pé, como que estivesse sempre sobre um salto imaginário. Adorava falar, sorrir e dançar!!! Sempre tinha uma performance da Madonna para nos apresentar - com uma certa timidez - na sala lá de casa para mim e minha irmã Rogenia, por quem ele sempre teve um carinho especial. Os anos passaram, ela externou ainda mais sua personalidade feminina e sempre foi muito querida na cidade, apesar dos preconceituosos e das más línguas que sempre existiram e existirão. Infelizmente Joelma sofreu um AVC e depois de complicações para quem tá tinha baixa imunidade veio a falecer já nos anos 2000 e pouco.

Não bastando estas personagens ilustres da cidade, esporadicamente apareciam umas figuras, digamos curiosas. Quando eu já era adolescente apareceu umas duas ou três vezes um casal de cegos muito instigante. Vi na casa da minha vizinha, Maria - esposa do Neuton  Araújo - uma muvuca de gente e, curioso que soooou, fui e conferi o que se tratava. Um casal de cegos com uma filha pequena e toda falante. Isso não era o atrativo e curioso da história... o cara, o marido e pai reconhecia células de dinheiro apenas pelo cheiro. E dá-lhe células diferentes para ele cheirar e dizer o seu valor..... e todos caindo nessa!!! Hoje eu acredito que na verdade ele não era cego total. Tinha uma baixa visão que lhe permitia enxergar a cédula a distância da altura de seu nariz. E nós totalmente admirados com as cenas. Kkkkkkkkk

Por fim recordo do Seu Margarida que, não sei onde morava exatamente, e que sempre vinha visitar seu filho Riba, que faleceu dias atrás, e fora criado pelo Antônio  Carpinteiro e Dona Chica, meus vizinhos, maravilhosos. Seu Margarida tinha um jeito de andar e falar como os caipiras matutos encenados em tantos filmes ou programas de comédias. O que mais era marcante nas suas visitas era seu gosto por cantar. Se ele cantava várias musicas eu não tenho recordação. Todavia ele sempre cantava uma música em específico, e a qual sempre o Seu Santinho - vizinho de frente - se divertia sorrindo e mandando ele cantar novamente. A letra da música dizia:

"Chorei, porque
Fiquei sem meu amor
O gavião malvado
Bateu asa foi com ela,
E me deixou

Quem tiver mulher bonita
Esconda do gavião
Ele tem unha comprida
Deixa os marido na mão
Mas viva quem é solteiro!
Não tem amor nem paixão
Mas vocês que são casado,
Cuidado com o Gavião!

Chorei, porque
Fiquei sem meu amor
O gavião malvado
Bateu asa foi com ela,
E me deixou

O culpado disso tudo é
O marido de agora, a muié
Anda na rua com as canelas de fora!
Gavião tomando cheiro,
Vem descendo sem demora
Pega muié pelo bico,
Bate asa e vai imbora!"

Passados muitos anos, já morando em São Luís, ouço na rádio uma música e reconheço a letra. A música cantada por Seu Margarida não é nada mais nada menos do que a música "Gavião Calçudo", uma composição resultante da parceria de Pixinguinha e Cícero de Almeida (o “Baiano”), lançado em 1929.
Clipe da Música "Gavião Calçudo"

Hoje vejo que a maioria dessas pessoas não tiveram oportunidade de acesso a tratamentos a seus casos relativos à saúde mental.Com o tempo fui compreendendo que estas pessoas taxadas de loucas tinham uma características em comum, todas foram autênticas, únicas, sinceras, verdadeiras e marcantes. Com o tempo passei a entender ainda mais as falas do grande escritor Ariano Suassuna: "Eu gosto muito de história de doido. Não sei se é por identificação. Mas eu gosto muito" e "Os doidos perderam tudo, menos a razão" e uma certa liberdade.

É isso... Mas, fica a curiosidade: quais seriam nossas características mais marcante não fosse nossas terapias ou nossos tarjas pretas de cada dia?

sábado, 20 de janeiro de 2024

NEM TODO MUNDO PODE APERTAR O BOTÃO DO BBB

   "Quando a sua identidade é forjada no mundo virtual e você se vê jogada no mundo real… esse desconhecido", postou em uma rede social a escritora Glória Perez acerca da desistência de Vanessa Lopes do Big Brother Brasil 24, programa da TV Globo. 

Vanessa Lopes, influencer e ex-BBB

    Para que esse texto faça maior sentido para você que não acompanha o reality show eu preciso dizer quem é Vanessa Lopes. Trata-se de uma jovem pernambucana, influenciadora digital, dançarina e cantora brasileira, de 22 anos, com mais de 30 milhões de seguidores no TikTok, onde faz sucesso com suas coreografias. Em resumo, uma das famosas convidadas a participarem do programa. Acontece que na última semana a participante vinha mostrando indícios involuntários que algo sério estava acontecendo com seu psicológico. Vendo sinais na parede, sentimento de perseguição, que todos eram atores contratados para lhe tapear, que todos estavam dando sinais de que os acontecimentos eram ligados a sua estadia no reality, acreditar que os artistas que fazem shows na casa estavam dando mensagens secretas para ela ou falar que recebe sinais dos quadros de decoração do local e outros.

       Sendo dessa geração, e sendo ela uma "personagem" que cresceu pessoal e profissionalmente ligada ao mundo da Internet e acabou por desenvolver uma personalidade virtual. A Vanessa Lopes que as pessoas conhecem é uma menina segura, confiante, vibrante alegre, feliz, que canta e dança... enfim, as pessoas conhecem só uma "imagem idealizada" que a Vanessa real quer mostrar, que gera engajamento. 

Vanessa Lopes durante crise de choro

     A geração TikTok vive nesse mundo em que as amizades vêm através de likes, o bem-querer se mede pela quantidade de seguidores e o conhecimento íntimo mais profundo do outro está nas nos feeds, reels e storys de cada um. Ora, se para as pessoas de gerações anteriores, assim como eu, que teve criação em um mundo real e pé no chão, que ainda tem a conversa olho no olho, que visita casa de um e de outro (embora com moderação), de experiências de infâncias raiz é difícil se encontrar nesse mundo virtual. Imagina para os que vive com a cabeça em outro mundo, como se fosse de fato um ser vivente no famoso metaverso.a 

       Só para se ter uma noção, em 2023, eu passei por alguns problemas psicológicos e psiquiátricos dadas às minhas experiências de vida que não me foram positivas em diversas fases de minha vida. Se antes me sentia sufocado por ser de uma família muito querida, tida como referência na cidade em que morava, vivia a comparação com os irmão mais velhos, inteligentes e estudiosos associado ao medo que tinha da reação das pessoas quanto a revelação da minha sexualidade. Agora, mesmo eu sendo um bom e belo exemplar de um autêntico leonino, eu não conseguia avançar em alguns aspectos da minha vida. Uma coisa que estava me prejudicando bastante era a possibilidade de ser pautas negativas das conversas das pessoas, o comportamento, olhar torto, as mudanças de assunto quando eu chegou perto delas... o medo do julgamento passou a me incomodar mais que antes. E eu tendo sido criado a base olhar percebo os mais sutis movimentos dos olhos durante as conversas, por exemplo. 

Momento em que Vanessa Lopes aperta o botão de desistência do BBB24. Fonte: internet 

       Com o tempo fui querendo eu ser um cara mais educado, mais cortês e racional nas minhas reações e respostas às situações da vida passei a tentar ignorar. Mas, depois ficava me consumindo e criando ranços, raivas, rancores, ódios, tristeza, ansiedade, depressão e pensamentos negativos. Tudo isso vindo crescendo de forma discreta e que só foi possível perceber quando já estava muito sufocante. Tudo isso crescendo como um avalanche e levando em consideração que eu não estava em um confinamento cercado e vigiado 24 horas por dia, apesar de postar muitos momentos "felizes" nas redes sociais. Para avançar esses pontos eu procurei ajuda psicológica e psiquiátrica que me acompanham até hoje e me farão companhia por tempo indeterminado.

Se para para mim que já tenho 44 anos, fui criado em um mundo real e não tenho a vida tão expostas tem sido um processo seguindo passo a passo, imagina esses jovens de vida virtual e superficial.  

    Voltando à pobre menina rica, Vanessa Lopes, que estava no confinamento global, ela disse por vezes que estava com medo do cancelamento na internet, estava com medo do julgamento paternos - ela disse que eles são frios e acham que chorar é coisa de gente fraca - e apresentou sintomas de nomofobia, transtorno causado pela abstinência do uso de celular. Em vários momentos apresentou picos de confusão mental... tudo isso foi gerando um sentimento de preocupação tanto nos colegas da casa mais vigiada do país quanto nos telespectadores do programa. A jovem, em meio a uma conversa e fazendo uma fala com sentido questionável, desistiu desse projeto que poderia lhe render uma premiação milionária. Levantou e apertou o botão que sinalizou sua desistência.

    Houveram até muitos casos de pessoas que reagiaram com preocupação, alívio e acolhimento, em especial alguns famosos. No entanto, após sua saída muitas brincadeiras sem graça foram postadas nas redes sociais. Muitas chacotas foram feitas... muitos deboches, muitos sarros foram tirados. Pois bem, em se tratando de uma pessoa com visíveis problemas psicológicos ou psiquiátricos é salutar essa postura ou pode pode agravar a situação? Fica aqui para a reflexão ao leitor. Contudo, na minha mais que humilde opinião, que já está formada, pelo meu histórico é que já vemos tantos casos de bullings cibernéticos e julgamento no tribunal da internet que terminam em morte que a reação das pessoas aqui fora deveria ser outra. Independente de gostar ou não da passagem da pessoa pelo programa, independente de cor, raça, religião e/ou posição política. Só pra citar o caso mais recente, as pessoas esqueceram o que aconteceu com a jovem Jéssica Canedo que foi julgada depoia viralização da fase news que dizer que ela tava de romance com o humorista Whindersson Nunes?

Jéssica Canedo e Whindersson Nunes.  Fonte: internet 

 Precisamos ter mais responsabilidades com o que vamos postar nas redes sociais, em especial as pessoas que têm muitos seguidores e que acabam por ter, por isso, mais peso nas opiniões lanacadas nas redes, pois acabam por influenciar outras pessoas a compartilharem de suas opiniões equivocadas.

  Em 2023, com ajuda dos profissionais que me acompanharam e dos que me acompanham atualmente eu consegui perceber muitos dos meus gatilhos que startam em mim muitos sentimentos negativos. Aprendi que preciso me acolher mais, não me julgando quanto a estes sentimentos por serem reações a situações vivenciadas de forma equivocadas e que não foram resolvidas da forma adequadaou se quer nem foram resolvidas. Além disso, houveram tantas outras situações que jamais poderiam ter sido vivenciadas por mim - e nem por ninguém, em especial enquanto criança -, mas, que por razões de terceiros fui vítima.

     Para 2024 minha principal meta é tirar do coração e da mente a questão de ainda ser vítima dessas situações passadas e de todos os sentimentos negativos que isso me causa ainda nos dias de hoje. Isso inclui acreditar mais em mim mesmo e julgar-me bem menos. Preciso ser muito mais #TeamRivas.

     Para chegar até esse meu estágio tenho o suporte profissional há um certo tempo. E quem não tem percepção de que precisa buscar ajuda? Ou não tempo hábil dessa busca durante uma crise? E quem não tem condições ou possibilidades de buscar a ajuda necessária? Ou pior ainda... e quem está em crise e é pego de repente, de surpresa por algum gatilho? Nem precisa ser um gatilho graaande e crueeel, pode ser uma "brincadeira" para quem faz, pode ser uma frase, um comentário... ninguém nunca sabe o nível do problema de saúde mental de outra pessoa. Quem tem ansiedade, depressão ou sindrome do pânico, por exemplo, entra num desespero gigante em que tudo é drastica e monstruosamente maior do que na real pode ser para quem tá de fora. Entretanto, é um sentimento de que a vida da pessoa é só problema sem fins. É tanta confusão mental que para parar tanto sofrimento só tem um fim... sair desse mundo. No mundo real não tem um botão do BBB pra pedir socorro. Só quem tá doente sabe o tamanho dos fantasmas que lhe afligem. E quem desejar isso a outra pessoa a não é mais humano. Quem não souber o que dizer, que não diga nada, mas que acolha nos gestos, ações ou simplesmente ouvindo. Sem julgamentos!