domingo, 10 de agosto de 2025

A MULHER QUE PLANTOU EDUCAÇÃO E COLHEU GRANDE LEGADO

 

Maria do Carmo da Silva Lima (Professora Mariazinha)

Sendo amanhã, 11 de agosto, o dia do estudante e o meu aniversário acho oportuno compartilhar o que aconteceu estas últimas semanas. Leia e entenda as razões para esta crônica e a importância dessas minhas lembranças para mim e tantas outras pessoas que igualmente foram alcançadas e abençoadas pelo dom e disposição da figura central dessa homenagem que faço em forma de texto àquela que me iniciou no mundo das letras.


Semanas atrás recebi um convite de uma amiga querida lá de Santa Teresa do Paruá convidando a mim e minha família a um evento que me deixou tremendamente feliz e triste ao mesmo tempo. Mas, a vida é tão boa que, na sequência, me deu oportunidade de alguma me fazer presente.

Vereador Filipe Teodoro entregando o título de Cidadã Honorária à Professora Mariazinha.

A pessoa que me mandou o convite foi Raquel Lima, filha de Quelé e Professora Mariazinha. O convite era para uma sessão solene na Câmara Municipal de nossa cidade. Receber este convite me deixou muito feliz pela lembrança e, principalmente, pela razão da cerimônia especial. Sua mãe, minha professora do pré-escolar, através de uma proposta do vereador Felipe Teodoro, receberia o título de Cidadã Honorária de Presidente Médici (MA). Quem não sabe nossa história — e talvez até quem conheça — não tem a menor ideia do quanto fiquei feliz com a iniciativa do Felipe — que vi ainda criança — e da aprovação do plenário da Câmara local. Não havia nenhuma razão para um voto contrário que fosse.


A única questão que me incomodou, ou melhor, que me fez lamentar foi o fato de não poder estar presente pessoalmente. Contudo, dias depois, minha amiga Graciélia entrou em contato perguntando se eu poderia assumir a missão de fazer um vídeo com depoimentos de ex-alunos parabenizando nossa mestra pela conquista. O tempo deveria ser bem reduzido para cada pessoa. Em dezenas de segundos não cabem dezenas de razões para o tamanho de nossa gratidão e contentamento pelos feitos dessa pessoa.


Para o leitor entender a razão da emoção por conta desse momento, é bom que se diga mais sobre a Professora Mariazinha.


Desde que me conheci por gente, já a conheci sendo professora do pré-escolar do Colégio Santa Teresa. Quase todos meus irmãos também foram seus alunos, pelo menos nós - Rivaldo, Riberio, Rogenita, Rogenia e eu, os cinco últimos filhos de mamãe - formos. 


Sr. Manuel Silva,  pai da Professora Mariazinha, durante a construção do Colégio Santa Teresa.

Recordo perfeitamente de minha ansiedade em ir para o jardim, pois ouvi minha mãe a dizer em umaconversando com uma vizinha: "Breve ele começa o jardim". Bastou para, dias depois, passando de bicicleta com meu irmão Riberio pela frente do prédio do prezinho, uma casa feita de madeira pintada de azul beeeeem clarinho, mais claro que azul-bebê. Na frente do prédio tinha vários pés de zínia - nas cores vermelha, amarela e rosa -. Quando cheguei em casa, eu já fui dizendo pra minha mãe que eu já podia começar a estudar, pois o colégio já tinha jardim. Ela caiu na gargalhada, pois não era esse o jardim a que ela se referia. Precisei esperar agosto, para completar cinco anos de idade para então minha matrícula ser aceita. Foi o que aconteceu. Estamos novamente em agosto e isso faz 41 anos que começou.


Quando enfim fui para o tão esperado jardim, lembro muito bem, minha mãe levou-me à porta da sala e a professora veio me receber na porta, me direcionou à minha carteira e me apresentou a meus novos coleguinhas. E já na apresentação, meu primeiro aprendizado: quando ela me perguntou qual o nome do meu pai e da minha mãe, eu respondi puramente "pai", "mãe", como eu chamava em casa e como ouvia meus irmãos chamá-los também. Ela, cheia de delicadeza, foi me explicar que pai e mãe é como a gente chama nossos pais quando precisamos falar com eles e que os nomes dos meus pais eram Raimundo Juruca e Dona Terezinha.

Paulo Roberto, Raquel, Clemilton- Quelé -, Professora Mariazinha e Paulo.

A aula seguiu e fui sendo encantado pelas artes mágicas do giz branco e dos gizes coloridos na lousa de duratex pintada de verde. Eram zigue-zague, onda quadrada, bolinhas, triângulos, fileiras de A de amor, E de escola, I de igreja, O de ovo e U de uva. Era desenhar gato com um círculo grande (barriga) e círculo pequeno (cabeça) e a voltinha embaixo pra ser o rabo... Eram desenhos mimeografados para colorir... Mônica, Chico Bento, Pica-pau, coelhinho da Páscoa, rosto de indígenas, velas de Natal... músicas escolares infantis na chegada, na hora do lanche e na despedida (Peixe Vivo, Sapo Cururu, Escravo de Jó, Marcha Soldado, Ciranda Cirandinha, Meu Lanchinho, Se Essa Rua Fosse Minha...). Maaaas, eu confesso, adorava mesmo era que a cantina era logo atrás da sala e nós tínhamos prioridade no atendimento (no primeiro dia, Dona Luzia do Bebé me serviu um copo de mingau de flocos de milho e ainda deixou eu repetir). Até hoje sinto saudades da merenda que ainda tinham no cardápio arroz com.carne de jabá, faroza de sardinha, chocolate quente ou suco com biscoito. 


Quando mudei de série, eu sempre dava um jeito de ir ver minha querida professora. Quando passava na frente de sua casa, sempre dei um jeito de encostar pra cumprimentar e, todas as vezes que voltei a Santa Teresa do Paruá, sempre busquei dar um abraço e, se não era possível, pelo menos saber notícias.

Professora Mariazinha e seu pai, Manuel Silva

Além das memórias escolares, jamais posso deixar de citar outro talento seu: o dom para os lanches mais gostosos da cidade. Que me desculpem as demais mães empreendedoras, não quero diminuir ninguém, mas a Professora Mariazinha tinha — deve ter ainda — o dom da mão certa na medida do tempero, na medida do açúcar, do leite. Tô falando de uma época que pais preocupados com o futuro dos filhos davam-lhes estudo escolar e doméstico para os deveres de casa, mas lhe davam também ensino pra vida através de pequenos trabalhos que ajudavam na economia familiar sem lhes podar o tempo de diversão. 


No caso específico da Professora Mariazinha e seu esposo, Quelé (Clemilton), seus filhos eram estimulados ao estudo e à diversão, mas — em especial os meninos — ajudavam com as vendas dos dindins — abacate, coco, maracujá, uva e morango —, pastéis, cartuchos e pães cheios. Nos 15 minutos que tínhamos de intervalo, eram os mais procurados! Aliás, fora eles tinham os meninos que vendiam pirulito de maracujá, cocada de coco queimado, bolos de arroz fritos, por exemplo. Bom demais!!!

Professora Mariazinha ao centro ladeada pelo Diretor Ir. Odyllo, colegas da escola e uma turma de alunos.

Recordo que no período da pandemia quando fiz uma exposição virtual para mostrar a história de fundação e construção do nosso saudoso Colégio Santa Teresa. Na ocasião, contei com ajuda de duas professoras maravilhosas que amo de paixão e tenho uma carrada de carinho, respeito e admiração, Roberta Kelly e Andréa Fernandes, que foram alunas de Mariazinha também. Na dissertação do mestrado da Andréa, tem um trecho de um depoimento da nossa professora acerca da construção do Colégio e sobre o envolvimento, aliás, mais que isso, da contribuição efetiva de seu pai, Manoel Silva: "Tem gente que criticava. Dizia que era só uma besteira. Porque meu pai trabalhava e o pessoal dizia assim: 'Agora, Mané Silva, como é que tu vai dar o que comer pra tua família, se tu vai trabalhar o tempo todo no Colégio Santa Teresa?', ele falava: 'Eu trabalho o dia no meu serviço e, de noite, eu vou pra lá'. E assim ele trabalhava. (...) De noite ele fazia aqueles aterros, ia quebrar pedra, era tudo uma festa, uma diversão pro povo". Essa fala mostra que, por mais difíceis que fossem as condições e o cotidiano também daquele pai, ele não só sonhava em oportunizar uma vida diferente a sua filha, como ele deu seu suor para construir esse sonho e deu a todos seus filhos possibilidades de buscar vida melhor que a sua. Seus filhos puderam, então, sonhar com vidas melhores para seus filhos, netos de seu Manuel... e assim foi e é. A menina Mariazinha tornou-se professora e ajudou dezenas de famílias a sonharem e centenas de crianças a se encaminharem na vida em destinos diferentes e inimagináveis. E, apesar dos caminhos diferentes que todos tomaram, pode-se afirmar que quem sabe ler e escrever pode até se perder no meio do caminho, mas nunca por falta absoluta de informações. Quem sabe ler e escrever pode até ser que não saiba para onde está indo, mas sabe onde está e, talvez, até possa mudar de rota. E no caso de Santa Teresa do Paruá, isso muito graças à Professora Mariazinha, que viveu o próprio sonho e ajudou tantos outros a sonharem. Graças a ela, que lançou luz nos nossos olhos através da leitura e da escrita de forma a nos fazer enxergar por onde estamos andando, rumo até onde quisermos e pudermos ir.

Depoimentos de amigos e ex-alunos 


Muito obrigado, Professora Mariazinha!




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